Ernesto Padilha. Ernesto para a família, Padilha para o mundo. Até Adalgiza, a colega de trabalho com quem o gajo estava de caso, só o chamava pelo sobrenome, inclusive nas horas de alcova. Não se sabe se por conta do hábito ou, então, para não levantar suspeitas. Se bem que o buchicho corria solto entre os funcionários.
Mal pisava em casa, a face do Ernesto se tornava funesta. Se dava um passo para fora, o sorriso estampava aquela cara de pau. Os amigos o recebiam de braços abertos, seja no bar, seja na repartição, seja na esquina para um bate-papo sobre as últimas desimportâncias.
Padilha andava com ideias de separação. Filhos quase criados, daqui a pouco era cada um por si e Deus para quem quisesse seguir a cartilha. Para Olívia, a esposa, deixaria a casa e uma pensão que não a deixasse passar fome. Estava de bom tamanho. Quanto a ele, cairia na esbórnia, pois sabia que um homem não pode fugir do próprio destino. Que assim fosse, como está escrito no manual dos canalhas.
Tudo parecia acertado para aquela sexta-feira. Pois é, uma sexta-feira! Melhor dia não poderia existir, já que sairia do serviço direto para o bar com os amigos e, de lá, rumaria para algum hotelzinho da região para passar mais uma noite com a Adalgiza. Pensando bem, já estava na hora de trocar a amante por outra, mesmo porque, vez ou outra, chega carne nova no açougue.
Chega de Ernesto, agora era só Padilha! E lá foi o homem, peito estufado, mais confiante que gorila em dia de briga contra mico, contar para o Juvenal, colega do trabalho. No entanto, aquele sorriso cheio de dentes bateu de cara contra a carranca do amigo.
— O que houve? Que cara é essa, Juvenal?
— O chefe me mandou te entregar isso. Ele mandou dizer que não é nada pessoal, mas apenas contenção de despesas.
Padilha ficou branco assim que bateu os olhos naquele bilhete azul. Sem forças para proferir palavras, deu meia-volta e retornou para a casa. Encontrou apenas a Olívia, os filhos estavam na escola. A esposa, que de boba não tinha nada, percebeu que o marido havia sido despedido. Ela o abraçou e procurou confortá-lo.
— Vai ficar tudo bem, Ernesto.
*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.
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