Felipe Meirelles
Notibras começa a publicar nesta terça-feira, 29, trechos do livro Páginas Viradas, que o jornalista José Escarlate projeta lançar no segundo semestre de 2016. A ideia de escrever o livro – conta o repórter em depoimento à Direção de Redação –, com fatos e histórias de alguns personagens que marcaram seus mais de 50 anos de profissão, nasceu por acaso, algum tempo depois de ele se aposentar, “forçado pela maldade e incompetência do governo Collor”.
– Concursado pela Agência Nacional, que mais tarde virou EBN, Radiobras etc, após 27 anos de casa fui demitido por telegrama, pois precisaram do meu cargo de carreira para colocar ali apaniguados, inclusive o careta que denunciou as façanhas da camarilha do ex-presidente, que foi defenestrado, revela.
A aposentadoria do INSS, enfatiza Escarlate, não dava por conta do fator previdenciário criado “pelo fantasioso FHC”. A partir daí, acrescenta, “fui à luta, tentando um trabalho. Depois de muito procurar, vi que não sabia fazer mais nada na vida, exceto jornal, em todas as suas nuances. A idade avançando e o coração falhando, e falhando feio, resolvi exercitar meus dotes de redator e pesquisador. Brincando, me distraindo ao fazer passar o tempo, era importante exercitar a memória”.
Alimentando a memória – Escarlate acredita que, pelo volume já preparado do livro, “sei obviamente que estou a exercitá-la (a memória) além da conta. Terei que enxugá-lo para não cansar a beleza dos outros. Ler um livro e escrever são as coisas mais gostosas da vida. Mas apoio o excelente escritor Ruy Castro, quando ele diz que “aquilo que você está pensando, é hors-concours.
Quem leu trechos de Páginas Viradas viu uma história de vida. De uma busca intensa pelo caminho a seguir, percorrendo atalhos, mudando de posições, numa longa caminhada. Escarlate diz que não se sente escritor, e que com o passar dos anos continua o mesmo repórter que viveu muitas histórias.
– Escrever, para mim, é uma necessidade. Escrevendo, sinto o retorno de um tempo em que redação de jornal tinha cheiro. Cheiro dos ácidos da composição, da impressão a quente, a valentia da rotativa em sua rotina ao final do dia. A palavra “reportagem” tinha som de máquina de escrever. A lembrança dos jantares da alta madrugada, depois de fechado o jornal, comentando os fatos do dia, já liberado da jornada estressante. Jamais me liguei ao velho refrão do devagar e sempre. Hoje, já passado nos anos, me sinto devagar. O sempre do velho é o momento vivido, repleto de limitações. Um amigo do peito me disse: “O futuro existe também para o idoso, mas é um futuro diferente. Com data de validade”.
Realmente, como acentua José Escarlate, “é importante reaprender a vida da forma como ela é hoje”. Uma vida, ele acrescenta, que vem cheia de recordações, principalmente dos amigos que nos deixaram. Lembra sempre as coisas boas e, também, as ruins. “Afinal, ruim mesmo é não ter o que lembrar. Vejo na relembrança que faço da vida, que ainda há muito a fazer. Porém, falta tempo. Os livros que não li, filmes que não assisti. Os amigos que não visitei, e os amores que não encontrei.”
Lembrança é saudade – No depoimento a Notibras, que antecede a publicação de Páginas Viradas, o repórter agradece a vida, que foi pródiga com ele. “Vivi o verão carioca de muita praia e amores, nos anos dourados, quando o Brasil era otimismo. Vivi invernos gélidos, com neve, temperatura perto dos 19 graus negativos. Flutuei entre os morros cariocas, palácios de reis, presidentes e imperadores”.
– Como tive também os meus amores, acompanhei os romances de figurões ao longo da história. Uns, eu vi, outros, ficaram na história. Rodei o Brasil e o mundo. Acompanhei lances intrigantes, sem jamais me envolver com políticos e a própria política. Circulei intensamente no meio artístico, como observador privilegiado. O que conto são histórias que tocaram meu coração, a minha sensibilidade, com casos e personagens curiosos e fascinantes. Muitas delas me fizeram rir ou chorar. Com algumas, me senti bem feliz, enquanto que outras me tiraram o sono, de indignação. Enfim, escrever, me faz feliz.
É essa experiência de vida que José Escarlate vai oferecer aos seus leitores. E aos leitores de Notibras. Mesmo porque, afirma categórico, lembrando o amigo Alcides Carneiro, “recordar não é viver. Recordar é viver de lembrança, e viver de lembrança é morrer de saudade”.