Por onde andará?
Esquecimento é a pior punição para os que prendem e arrebentam
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emAo pronunciar a frase “Um homem sem ética é uma fera solta neste mundo”, o escritor, filósofo e ensaísta franco-argelino Albert Camus com certeza anteviu a desgraça política que o Brasil viveria com a ascensão de entidades mitológicas sem eira e nem beira. A quadra foi terrível, mas, como tudo de ruim, passou e desapareceu na ventania que soprava nos 7 infernos de Dante para os quintos do centro da terra, onde, diz a lenda de Dante Alighieri, Lúcifer está à espera. Pois que sumam e não voltem para nos tirar a paz conquistada na beira do cais, “onde o fim da tarde é lilás”.
Vivemos o lado mais trágico da comédia conservadora extremista, mas, antes que a fonte secasse, percebemos o valor da água cristalina, denominada metaforicamente de democracia. Mais uma vez a confusão mental me trai e novamente me leva a escrever sobre alguém que durmo para esquecer, mas acordo só para dele lembrar. Triste do ser humano que nasce, cresce e vive para destruir o que o outro construiu, disse, leu ou escreveu. Ainda que oriundos de mandiocas diferentes, somos farinha do mesmo saco.
Por isso, para mim é difícil entender por que determinados segmentos da sociedade querem obrigar a que pensemos como eles. Da direita à esquerda, do Flamengo ao Vasco da Gama e da Mangueira à Portela, cada um dos 213 milhões de brasileiros tem o direito de ser o que bem quiser. O tempo (sempre ele) se encarregará de mostrar os erros ou acertos de nossas escolhas. E, para nossa sorte, o tempo não esconde nada de ninguém. Os ruins passarão e nós, os defensores das boas ações e dos gestos humanitários, passarinhos.
Lamentável do ponto de vista filosófico, mas é do ser humano mais próximo da diáspora satânica se insurgir contra o que está bem e faz bem. Diriam os mais céticos que, por longos quatro anos, pensar e pensar dia e noite com a frase daqui não saio, daqui ninguém me tira não era somente uma lembrança da marchinha composta nos anos 50 por Paquito e Romeu Gentil, mas um sonho de consumo, macetado graças à força de alguns poucos generais loucos para novamente colocar o bloco na rua.
Tudo indica que a escolha do protagonista foi errada. Desengonçado, apoplético, surdo e cego diante dos anseios do povo e sem respaldo científico, humanista ou militar, o cidadão é um zero à direita, está longe dos holofotes, perdeu o rebolado, poucos querem vê-lo no mesmo palco, mas sua reconhecida fleuma o faz se sentir eternamente como o rei da cocada preta. Nunca foi. Pelo contrário. Como um poema de gago, é um mo-mo-moribundo fi-fi-fingido que não de-deixou sa-sa-saudade nem me-me-mesmo na-na-que-queles que de-de-defendem a di-di-tadura.
Entre seus grandes feitos, o maior deles foi gritar ao mundo daqui não saio, daqui ninguém me tira. Desse modo, passou quatro anos criando dificuldades para que o povo lhe apresentasse facilidades. No fim das contas, dinheiro e poder eram as palavras que alimentavam suas rugas. Se imaginando o Imperador do Cerrado, fez o que não podia fazer. Agora, a Inês está morta. Enquanto não vence seu prazo na planície, ele aguarda um perdão que jamais virá. Do tipo que só percebe o valor da água depois que a fonte seca, de casa assiste a dispersão do eleitorado e segue a passos largos rumo à pior das punições para aqueles que prendem e arrebentam: o esquecimento.
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*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978