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Abudo de autoridade

Estão mudando a legislação de ruim para muito pior

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Ricardo Brandt, Fausto Macedo e Julia Affonso

Procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato – maior ofensiva contra a corrupção do Brasil – fazem um alerta: as alterações no texto do projeto de uma nova lei de abuso de autoridades, aprovado pelo Senado, a toque de caixa, na última quarta-feira, 26, não tiraram da medida os riscos oferecidos à investigações como a do escândalo Petrobras.

“O projeto, de autoria do senador Renan Calheiros (PMDB-AL) e relatado pelo senador Roberto Requião (PMDB-PR), deixou de ser péssimo e ficou apenas muito ruim”, afirmou um dos membros da Lava Jato, em Curitiba, o procurador da República Roberson Pozzobon.

“No projeto ainda há, por exemplo, dispositivos que criminalizam a interpretação do direito, desmantelam importantes instrumentos de investigação e promovem a mordaça onde a regra deveria ser a transparência.”

A proposta, aprovada no Plenário do Senado, no mesmo dia em que foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), vai ser analisada e votado na Câmara dos Deputados e ainda precisa ser sancionado pelo presidente da República, Michel Temer (PMDB), para valer. “Esperamos que na Câmara dos Deputados o procedimento seja diverso e a vontade do povo – não o interesse de alguns de seus ‘representantes’ – seja acolhida.” A seguir, a entrevista com o procurador:

Há ainda pontos preocupantes na proposta de uma nova lei de abuso de autoridades, aprovado no Senado e enviada à Câmara?

Graças a um amplo e fundamental apoio da sociedade, houve adaptações no projeto de lei de abuso que minimizaram alguns de seus riscos mais aberrantes à independência das instituições. Com isso o projeto, de autoria do Senador Renan Calheiros e relatado pelo Senador Roberto Requião, deixou de ser péssimo e ficou apenas muito ruim. Isto porque, não obstante as diversas críticas e apontamentos feitos, a opção do relator foi por manter no texto pontos que ainda representam grave ameaça aos agentes públicos que se dedicam à investigação, processamento e julgamento de crimes de corrupção praticados por ricos e poderosos. No projeto ainda há, por exemplo, dispositivos que criminalizam a interpretação do direito, desmantelam importantes instrumentos de investigação e promovem a mordaça onde a regra deveria ser a transparência.

Os itens que tratam sobre antecipar atribuição de culpa é um risco para a transparência pública de investigações, algo que foi essencial para Lava Jato até aqui?

A Constituição da República estabelece que em regra os processos e decisões judiciais devem ser públicos, motivo pelo qual a transparência tornou-se um pilar fundamental na Operação Lava Jato, reservando-se o sigilo apenas aos casos em que ele é imprescindível para o sucesso das investigações. Dentro desse contexto, causam bastante preocupação alguns dispositivos inseridos na lei de abuso que vão na contramão da regra de publicidade estabelecida na Constituição. Eles parecem se destinar a promover o sigilo de investigações para proteger a reputação de investigados envolvidos em crimes graves, ao invés de permitir que a sociedade acompanhe e controle os feitos em que estes agentes são investigados do início ao fim. A sociedade pode e deve acompanhar e fiscalizar a investigação e o processamento de agentes privados, públicos e políticos que praticaram atos de corrupção, afinal de contas é a grande vítima e interessada na responsabilização desses criminosos.

A proposta continua uma tentativa de intimidar investigadores e juízes?

Diversos dispositivos desse projeto de lei ainda permanecem, sob o pretexto de coibir abusos, servindo para ameaçar, travar e promover a insegurança de agentes públicos que se dedicam, no estrito cumprimento de suas funções, ao combate da corrupção. Se a pressa no Senado não permitiu que esses pontos fossem aprimorados, esperamos que na Câmara dos Deputados o procedimento seja diverso e a vontade do povo – não o interesse de alguns de seus “representantes” – seja acolhida. Somente assim esse projeto poderá se tornar uma lei que não materialize em si um abuso no poder de legislar.

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