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Estupidez transborda campo político e incomoda brasileiro

Embora antagônicas do ponto de vista conceitual, ignorância e estupidez se transformam em problema insolúvel quando atingem o mesmo ser humano. Ignorante é aquele que desconhece algo. Nesse sentido, como ninguém sabe tudo, todos temos algum grau de ignorância. A estupidez remete à falta de bom senso, sensatez ou razoabilidade. É uma espécie de ausência defeituosa da inteligência, em discernimento ou senso. Didaticamente, é a atitude daquele que, não sabendo utilizar suas capacidades racionais, engana-se quanto à qualidade de seus conhecimentos. Triste, mas é a realidade do ex-poderoso presidente do PTB e ex-deputado federal Roberto Jefferson, que hoje encarna um antigo pensamento de Martin Luther King Jr.: “Nada no mundo é mais perigoso do que a ignorância sincera e a estupidez conscienciosa”.

O problema é que, ao contrário do meu cartão de crédito, a estupidez não tem limites. O pior é quando essa “coisa” vira patriotismo. Mesmo povoando a política nacional, ela, na mesma proporção, incomoda o povo mais sensato. À beira do precipício econômico-social, mergulhado em uma crise existencial inimaginável e já no fundo do poço da hipocrisia e da falta de respeito com o próximo, o Brasil de Jair Bolsonaro e de seus odiosos e odiados seguidores está cada vez mais próximo da Idade da Pedra. Período da pré-história, esta é a fase em que a humanidade deixou de viver em cavernas. Resumidamente, é o berço da  evolução do gênero Homo. Com inteligência e recursos mínimos, foi a época em que os homens, desaculturados e, portanto, grosseiros até a medula, achavam normal subjugar mulheres e vilipendiar subalternos ou menores em termos de cidadania, conceito que significa a qualidade de ser cidadão, consequentemente sujeito a direitos e deveres.

Na verdade, o vocábulo cidadania não existia e, caso Bolsonaro seja o vencedor no dia 30, certamente deixará de existir a partir do primeiro dia de novembro. Voltaremos à primitiva época em que os normais assistirão ao retorno dos brucutus, no melhor estilo de Roberto Jefferson. Não excluo Jair Bolsonaro dessa lista, embora, acredita-se, que ele não tenha nada a ver com o banditismo protagonizado por Jefferson. Em síntese, os fatos desse fim de semana mostram que não há nenhum exagero na afirmação de que o primitivismo pessoal e, em algumas situações, coletivo, está se consolidando na era paleolítico-bolsonarista. E eles (os fatos) estão umbilicalmente vinculados à política brasileira do ódio, das ameaças e dos xingamentos. A uma semana da eleição presidencial, foi exatamente o que ocorreu com a tentativa de retorno de Jefferson à ribalta eleitoral.

Talvez nada tenha a ver com o atual quadro de votos e seja apenas mais um dos meus exageros. Pode ser, mas como explicar o destempero do ex-deputado justamente agora, quando Bolsonaro permanece atrás de Luiz Inácio, o diabo a ser expurgado do mundo moderno. Há coisas e homens muito piores no atual estágio do país, mas Lula é o capetão a ser dizimado. O fato é que, por discordar de uma decisão judicial – apenas por isso -, o indigno e nefasto cidadão Roberto Jefferson se achou no direito de macular a honra de uma compatriota, chamada de “Bruxa de Blair”, “Cármen Lúcifer” e “prostituta”. Interessante é o detalhe. Pasmem, mas o ataque – poluído de preconceitos e gestos pra lá de imbecis – não foi a qualquer um, mas a uma ministra da Suprema Corte da nação. O dito cidadão, acusado de integrar e chefiar milícias digitais, também atacou a Corte Suprema e o sistema eleitoral.

Ainda que seja um incorrigível defensor da liberdade de expressão, aceitar que alguém se dirija a uma autoridade da forma como esse apoplético senhor se dirigiu à ministra Cármen Lúcia é fechar com a intolerância sem nível e sem perdão. Infelizmente, mais esse repugnante, estúpido e ignorante episódio sofrido pela República é a marca do modo Jair Bolsonaro. Mais do que isso, é emblemático, na medida em que o gesto do ex-parlamentar que se acha acima do bem e do mal foi endossado e aplaudido por grupelhos daquela turma que faz do ódio uma forma de vida. Pois bem. Bolsonaro é somente um postulante a um segundo mandato, hoje com alguns milhões de votos atrás de Luiz Inácio. Imaginem o que farão os comandantes e comandados do ódio no caso de vitória do grupo assemelhado a uma horda.

Difícil qualquer conclusão, mas as ilações não estão proibidas. Qual é a ideia ou qual o comando de Jefferson a oito dias do segundo turno presidencial? Seria novamente produzir um fato novo? Seja lá o que ele pensou, ficou pelo caminho, pois teve de voltar para o local de onde jamais deveria ter saído: a prisão. Como escreveu um importante colunista de Brasília, isso não é política, mas cafajestada no grau mais perigoso. Pura verdade, principalmente após a constatação de que a mais cristalina definição da estupidez é conhecer a verdade, ouvir a verdade, repetir a verdade e, mesmo assim, acreditar na mentira. É exatamente aí que mora o perigo da democracia e de suas consequentes liberdades. Considerando que a juventude envelhece, a imaturidade é superada, a ignorância pode ser educada, a embriaguez passa, mas a estupidez é eterna, estaríamos entrando em uma nova e irrecuperável fase? Tomara que não. Parafraseando o imortal papa João Paulo II, estupidez também é presente de Deus, mas não se pode abusar.

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