Michael Flynn, ex-conselheiro de segurança nacional de Donald Trump, disse em acordo de delação premiada que foi orientado pelo comando da equipe de transição do então presidente eleito a discutir com o embaixador russo nos EUA as sanções aplicadas ao país pelo ex-presidente Barack Obama em resposta à interferência de Moscou nas eleições de 2016.
Segundo ele, o assunto foi discutido no dia 29 de dezembro em telefonema com integrante da equipe de transição que estava com Trump no resort Mar-a-Lago, na Flórida. No dia anterior, o representante da Rússia nos EUA, Serguei Kislyak, havia telefonado para Flynn.
O então futuro chefe do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca foi orientado a dizer ao diplomata que a equipe de transição gostaria que a Rússia não agravasse a tensão com os EUA com uma resposta às sanções impostas por Obama. A avaliação era de que isso poderia afetar os objetivos de política externa do governo Trump. A delação premiada não faz menção a esse fato, mas uma das aspirações do então presidente eleito era se aproximar de Vladimir Putin.
Assim que recebeu a orientação, Flynn a transmitiu a Kislyak. No dia 30 de dezembro, em uma declaração surpreendente, Putin disse que não retaliaria os EUA em razão das sanções. Um dia depois, o diplomata russo telefonou a Flynn para comunicar a decisão de seu governo. Em seguida, Flynn relatou a conversa a integrantes da equipe de transição.
O ex-conselheiro de segurança nacional de Trump decidiu fechar um acordo de cooperação depois de ter sido acusado de mentir ao FBI sobre o teor de seus contatos com o diplomata russo, crime punido com até cinco anos de prisão. As declarações falsas foram dadas no dia 24 de janeiro, quando ele já estava na Casa Branca. Na época, ele negou que tivesse discutido as sanções com o embaixador russo.
O general da reserva é o primeiro ex-integrante do governo Trump a ser acusado pelo procurador especial Robert Mueller, responsável pela investigação sobre a influência de Moscou na disputa entre Trump e a democrata Hillary Clinton. Mueller investiga se houve conspiração entre integrantes da campanha republicana e cidadãos russos para prejudicar a candidatura da democrata, vista por Putin como hostil a seus interesses.
A expectativa é que o acordo de delação premiada envolva integrantes da cúpula do governo, entre os quais pode estar o próprio Trump. O índice da Bolsa de Nova York caiu 300 pontos nas horas seguintes ao anúncio de que Flynn estava cooperando com Mueller.
As ações do ex-assessor e de integrantes da equipe de transição podem ter violado o Ato Logan, que impede cidadãos americanos de negociarem com governos estrangeiros em disputa com os EUA. Os contatos com o diplomata russo ocorreram antes da posse de Trump e tiveram por objetivo minar políticas implementadas pelo governo americano em relação a um país considerado hostil.
No acordo de delação premiada, Flynn também reconheceu ter mentido ao FBI sobre contatos que teve com Kislyak em relação à votação, no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas, de resolução que condenava assentamentos israelenses em territórios palestinos.
A proposta foi apresentada pelo Egito no dia 21 de dezembro, um mês antes da posse de Trump. O governo Obama havia decidido se abster na votação, posição da qual seu sucesso discordada. Ao FBI, Flynn disse que não pedido que países mudassem sua posição na votação.
Mas nesta sexta-feira, ele admitiu que foi orientação pelo comando da equipe de transição a entrar em contato com integrantes do Conselho de Segurança e pedir que eles votassem contra a resolução ou adiassem seu posicionamento. No dia 22 de dezembro, Flynn discutiu o assunto com Kislyak e solicitou que a Rússia se opusesse à proposta – um dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança, o país tem poder de veto. No dia seguinte, o diplomata respondeu que Moscou votaria a favor da resolução, o que de fato ocorreu.
Antes de demitir o então diretor do FBI James Comey, em maio, Trump pediu a ele que abandonasse investigação sobre as ações de Flynn e seus contatos com a Rússia. O presidente afastou Comey antes do fim do mandato de dez anos normalmente dado aos diretores do FBI para garantir sua independência. Na época, Trump disse em entrevista que havia demitido Comey por causa da investigação sobre a Rússia.
O afastamento acabou levando o Departamento de Justiça a indicar um procurador especial para comandar a investigação. Realizada no dia 17 de maior, a nomeação de Mueller contrariou Trump, que gostaria de ver o caso encerrado.