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Cadáver insepulto

Executiva do PT dá uma de sujo e tenta limpar a barra do mal lavado

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Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo* - Foto de Arquivo

Esquecendo que seu principal atleta eleitoral chegou e venceu a final de 2022 porque a maioria dos juízes (o eleitor) desclassificou o adversário, a Executiva do PT queimou a largada e, por meio de nota sem fundamentos, aproveitou a eleição da Venezuela para tentar um salto triplo carpado invertido. No entanto, ao reconhecer a trapaça e a contestada vitória de Nicolás Maduro, o comando petista não passou de uma grupada de quadril para trás. Desconheço a nomenclatura da ginástica artística, mas está claro que, muito mais do que precipitação, os termos significam que a decisão da ala comandada pela deputada paranaense Gleisi Hoffmann foi uma pisada fora do tatame político.

Na verdade, a nota esvaziou a estratégia do presidente Luiz Inácio para as barras assimétricas. A cautela de Lula sobre a lisura da eleição venezuelana se perdeu no caudaloso Rio Sena da vaidade de setores petistas. Não sei se ex ou se ainda aliado do ditador, o fato é que Lula cobrou as atas, elogiou os eleitores, mas permaneceu no muro. O povo de lá e o de cá quer saber se ele viu fraude ou não na maracutaia de Maduro. Considerando que Lula é a grande estrela da trupe, melhor que o faça com serenidade e de acordo com o esperado pela população que tem ojeriza a ditaduras e, portanto, condena qualquer mandatário que opte pelo autoritarismo. Por isso, até hoje os libertários se opõem ao 8 de janeiro de 2023 e a seu principal estimulador Jair Messias.

Quanto à Executiva do partido, vale aproveitar a máxima do imperador romano César no imbróglio com sua mulher Pompeia. Em tempos de polarização com a extrema-direita, ao maior partido da esquerda não basta ser democrata. Ele tem de parecer democrata. Não foi o que fez. Muito pelo contrário. Dizer que a eleição de Maduro foi “pacífica, democrática e soberana” é o mesmo que afirmar publicamente que Jair Bolsonaro não estava totalmente errado ao propor a seus “patriotas” um golpe contra os que lutam por liberdades. O PT não ganhou nada com a nota, mas, para alguns, endossou, voluntária ou involuntariamente, o golpismo do mito. Como diz o velho ditado, mijaram foram da bacia.

Mutatis mutandis, lembra a contenda entre o Zeca Cagado e o Kotóba Nokano. O resultado da luta entre eles é simples: se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. Na prática comum aos sem noção, o PT deu uma de roto defendendo o esfarrapado ou de sujo falando do mal lavado. Seja lá o que for, a farsa eleitoral de Nicolás Maduro é indefensável política, criminal e moralmente. O que se viu no fim de semana na Venezuela é um dos mais desastrosos espetáculos já vistos em uma eleição presidencial. Na visão de analistas isentos e sensatos, só não foi mais grave do que o vandalismo bolsonarista de 8 de janeiro de 2023, na Praça dos Três Poderes.

Além de se autoproclamar presidente, Maduro também alcançou no domingo (28) o topo dos líderes políticos mais odiados do mundo. Sem apoio das grandes potências democráticas, parece bosta n’água, um cadáver insepulto. Quem sabe um monte de estrume de jumento manco. Fazendo coro àqueles que não acreditam numa vírgula da vitória de Maduro, mantenho minha posição favorável a qualquer um que, na eleição de 2022, derrotasse o representante do arbítrio. Coube a Luiz Inácio esse papel. Embora com ressalvas, eis a razão pela qual defendo seu mandato, do mesmo modo que defenderia quem resistisse à tirania de Jair Messias, cuja atuação política de quatro anos em nada difere do déspota venezuelano.

Ainda ecoa em meus ouvidos detestavelmente apurados a praga dos bolsonaristas. Segundo eles, vencedor das eleições de 2022, Lula iria venezuelizar o Brasil. O tempo e os fatos mostraram quem estava certo e quem estava errado. Em resumo, os que imaginavam Nicolás Maduro um exemplar de proa da esquerda, devem estar convencidos de que o vizinho ditador sempre esteve vinculado ao que há de pior no extremismo à direita: a ignorância selvagem. Talvez não, porque um povo ignorante morre de sede mesmo estando à beira de um rio. Em uma de suas numerosas teses filosóficas, Aristóteles escreveu que a diferença entre um homem sábio e um ignorante é a mesma entre um homem vivo e um cadáver. Vistam a carapuça aqueles que defendem o cadáver.

*Wenceslau Araújo é Editor-Chefe de Notibras

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