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Exercício do prazer ainda é o melhor remédio para a vida

Decidido a ficar pelo menos um dia sem o cheiro de dejetos da política brasileira, mais um vez me dispus a buscar nas baboseiras relaxantes do cotidiano o tema da narrativa de hoje. Gosto muito de falar do tempo, não do meteorológico, mas o da reflexão, o da duração relativa dos fatos e das coisas que criam no ser humano a ideia de passado, presente e futuro. O meu tempo determina os momentos, os períodos, as épocas, as horas, os dias, as semanas, os séculos e os acontecimentos neles ocorridos. Do alto de meus tantos e poucos anos, aprendi que o valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. É uma travessia. E, se não ousarmos fazê-la, perdemos o bonde da história, ficaremos para sempre à margem de nós mesmos, pois, embora não queiramos saber, o tempo é breve.

O tempo perdido jamais volta. Por isso, precisamos aproveitar com sabedoria cada segundo que temos. Afinal, nunca é perda de tempo se você consegue aprender algo. Não devemos esquecer o quanto é bom quando o tempo confirma que tomamos a decisão correta. Os dias talvez sejam iguais para um relógio, mas não para um homem. Comigo sempre foi assim. De uma forma maravilhosa, o tempo me mostrou o que realmente era importante na vida: ser feliz a seu modo e a seu tempo. Por exemplo, desde menino tinha objetivos, mas em nenhum momento fiz deles minha razão de viver. Uma vez ouvi do brilhante, inimitável e inesquecível Chico Anysio a paródia do coelho e do jabuti. Um corre léguas e pula diariamente, mas normalmente morre aos 2 anos; o outro não faz nenhum exercício, caminhava alguns metros em várias horas, mas vive até 200.

Foi aí que descobri que o tempo é a grande esperança de quem tem pequenos sonhos. Então, por que correr se nossa missão não tem pressa? Por isso, ainda que esporadicamente me exercite, minha preferência são os exercícios mentais. O exercício prazeroso é o melhor remédio da vida. Como justificativa, costumo recorrer mentalmente ao meu disse onário particular. É ele quem me lembra algumas estórias com ações nem sempre verídicas, mas que passam a ser verdadeiras quando as transformo em histórias do meu anedotário particular. Não tenho confirmação, mas há indícios de que o inventor da esteira morreu aos 54 anos, três anos a menos que o inventor da ginástica. Mais gritante foi o campeão mundial de fisiculturismo, que passou dessa para melhor aos 41 anos. Fundador da Herbalife, Mark Huggues partiu aos 44 anos.

Craque de futebol e uma droga nos exercícios físicos exigidos pela profissão, o argentino Diego Armando Maradona viveu um pouco mais. Morreu aos 60 anos. Na outra banda, Harland David Sanders, criador do frango frito KFC (lanche nada saudável), se foi aos 91 anos, oito a mais do que Richard Hennessy, fundador do Conhaque Hennessy e 10 a mais do que Pietro Ferrero, criador da Nutella. Melhor falar baixinho sobre as mortes do percussor da R. J. Reynolds, proprietária dos cigarros Winston, e do responsável pela industrialização do ópio. Embora careça de checagem mais apurada, tenho informações de que o primeiro fez o passamento ainda menino, aos 102 anos, 14 a menos do que o industrializador do alcaloide retirado do látex da papoula, que morreu em um terremoto.

Por ciúme, inveja ou dor de cotovelo (acho que as três coisas), lamentavelmente minha fonte excluiu da lista de sedentários longevos o mito norte-americano Hugh Marston Hefner, fundador e editor-chefe da mais famosa revista erótica do mundo, a Playboy, lançada em dezembro de 1953. Apenas como ilustração, as fotografias quase sacras das moçoilas enchiam as mãos da rapaziada do meu tempo. Como ninguém questionou, deixo por conta da imaginação de cada um a resposta sobre a ocupação de minhas (…) enquanto folheava a publicação. Importante é que, de pé e absolutamente lúcido, Hefner morreu aos 91 anos, rodeado de garotas cerca de 70 anos mais novas. Portanto, a pergunta que não quer calar é simples: como os médicos concluíram que exercícios prolongam a vida?

Leigo no assunto, faço minhas as palavras de um velho cardiologista que encontrei nos bons tempos do Congresso. Claro que não segui à risca (e não sigo) seus ensinamentos, mas lembro deles como um mantra: “Vá com calma, descanse um pouco, ame muito, coma bem, tome seu vinho, sua cervejinha, beba um whisky ou uma caipirinha de vez em quando e aproveite sua vida com prazer!” Em síntese, fui em frente, não exagerei e me “estraguei” com moderação. Não fujo da morte, mas tento ficar o mais distante possível dela. E vez por outra me faço a mesma pergunta. Quanto tempo o tempo tem? Na cabeça desocupada, imagino que o tempo responda pro tempo que o tempo tem o tempo que o tempo tem. Ponto final.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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