O retrato do Brasil de hoje não deve ser o de amanhã, muito menos o de 2022. Por tudo que já mostrou e certamente ainda mostrará, o atual governo não mudará de postura e, por essa razão, deverá sofrer os mesmos percalços de administrações anteriores. Qualquer cidadão que um dia já discutiu política ou futebol tem conhecimento da impossibilidade de convencimento de interlocutores enganados por discursos ufanistas ou baseados em teses ideológicas. Não adianta tentar informá-los sobre os diversos tons de cinza. Para essas pessoas, não há hipótese da variação da cor. Ou seja, o cinza é cinza e ponto. Não há nuances, vírgulas, dois pontos ou exclamações, muito menos reticências. Para eles, o errado é certo e a mentira bem contada é a mais pura verdade.
Mudando de vertente, é impossível convocar vascaínos ou corintianos para engrossar a torcida do Flamengo contra um dos grandes da Argentina, ainda que, para o presidente argentino, o “europeu” Alberto Fernández, todos os brasileiros sejam oriundos da selva. Somos índios, mas cada um na sua tribo. Vermelho e preto e cruz de malta não se misturam. Quando isso ocorre, infelizmente sobra pouca coisa para uma boa história. Os enganados e os engajados acabam transformando em guerra o que deveria ser uma disputa salutar e apenas entre diferentes. Por analogia, a política brasileira de nossos dias está pior do que uma partida de futebol entre dois extremos da mesma várzea.
É um vale tudo. Xingar a mãe e chutar o saco são gestos irrelevantes. Vence a peleja ou satisfaz o ego aqueles que ofendem, atingem a honra ou ferem de morte o eventual opositor. Tudo isso é sinônimo do ódio que enfrentamos e, tomara, seja passageiro. Os que assim agem esquecem que nada nessa existência é por acaso. Diz a Bíblia que aqueles que com ferro ferem um dia com ferro serão feridos. É da lei divina. Claro que a vida nem sempre segue nossa vontade, mas, bons ou ruins, devemos estar atentos sobre uma certeza para a qual só despertamos quando não há mais tempo: a vida é perfeita naquilo que tem de ser. Difícil deve ser conviver com os que julgam de nada precisar.
Determinadas ideias são como sementes: não podem germinar fora da estação apropriada, tampouco em terreno que não tenha sido de antemão preparado. É o Brasil de hoje. Com propostas acanhadas e, às vezes, recheadas de paganismo, extremos de lá e de cá, cada um a seu modo, entendem que não existe nada além deles. Na avaliação equivocada desses segmentos, não se alinhar é sinônimo de omissão ou alienação. Equivocadamente, avaliam não haver salvação para aqueles que orbitam fora dos eixos à direita ou à esquerda. Esses estarão fadados à morte ou ao ostracismo político. Embora essa possibilidade seja real, os extremistas esquecem que discordar do atual presidente da República não significa apoiar o PT de olhos fechados.
Existe vida inteligente além dessa disputa. Entre direita e esquerda, prefiro a alegria e a paz. Chega de ódio. Até 2022, o leque deve ser aberto mais ao centro. Torcerei para que isso ocorra de forma equilibrada. Afinal, não precisamos de muitos candidatos. Queremos bons candidatos. No entanto, caso não haja essa alternativa, a decisão da maioria já está tomada: votar em quem, apesar de numerosas adjetivações nada republicanas, é um democrata de carteirinha. É disso que precisamos. É isso que buscamos. Entre o golpe e a perpetuação no poder, a direita está perdida, principalmente porque já se tocou que, em caso de vitória do líder do negacionismo, todos serão jogados no mesmo balaio negro. Diante do dilema, seus membros lembram o cachorro que caiu do caminhão de mudança. Que caminho seguir?
Enquanto escolhem, mais fácil obedecer ordens. A do dia é desobrigar o povo já vacinado do uso da máscara facial. Que mal o pedaço de pano fez ao autor desse disparate? Jogue fora a dele. A minha continuarei usando até que o vírus seja dizimado. Não podemos nos responsabilizar pelo que os outros fazem de suas vidas. Cada qual é livre para fazer o que quer de si mesmo, inclusive, se for possível, morrer antes do tempo. O problema é que, para o bem ou para o mal, atitudes inspiram atitudes. As asas podem até ser iguais para todos, mas o destino do voo é você quem escolhe. Portanto, entre tirar a máscara e quem mandou tirá-la, melhor renegar a segunda opção.
*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978