Raio-X Capixaba
Falta comida, falta ônibus, sobram mortos e violência
Publicado
emBartô Granja, Edição
Apesar da presença das Forças Armadas ser cada vez mais ostensiva nas ruas de Vitória, capital do Espírito Santo, municípios vizinhos o povo capixaba continua com medo. A sensação de insegurança que tomou conta das cidades. E o elevado número de lojas fechadas está fazendo com que a população lote os grandes supermercados da região.
Na manhã desta quinta-feira, 9, o maior supermercado do bairro residencial de Mata da Praia, registrava enormes filas. Alguns produtos já estão acabando e o estabelecimento tem feito interrupções no serviço ao longo do dia devido à dificuldade de fluxo no interior da loja.
“Está parecendo a Venezuela, só que lá não tem alimentos”, afirmou o administrador Sebastião Guimarães, de 57 anos. “Estamos estocando alimentos, mas aqui também já estão faltando alguns produtos. Ontem minha mulher não encontrou carne.”
A falta de alguns produtos foi confirmada pelo subgerente do supermercado, Adélio Ramos. “Estamos com poucos funcionários. Os que estão vindo trabalhar é porque a gente está indo buscar em casa, já que não tem ônibus nas ruas. Alguns fornecedores também não têm feito entrega. Hoje, por exemplo, não tem mais ovos”, comentou. Os repositores trabalhavam sem parar durante a manhã, mas a prateleira com macarrão instantâneo já estava praticamente vazia.
Medo – O aposentado Ervino Nitz, 77, saiu de casa pela primeira desde o final de semana, quando estourou a crise na segurança no Espírito Santo. As compras do dia foram maiores do que em circunstâncias normais. “Estou me prevenindo, mas a gente fica até chateado com o que está acontecendo”, declarou.
Ele disse que, com o passar dos dias, ganhou “um pouco de confiança” para voltar às ruas. “Estou perdendo um pouco do medo, mas só vou para a rua pela manhã. Mais pro fim da tarde começa a ficar perigoso”, destacou o aposentado.
A autônoma Lúcia de Fátima Merçon, 62, por sua vez, demonstrava mais tranquilidade. Ela não se queixou da grande fila que tinha pela frente para pagar as compras no caixa. “Tenho vindo quase todos os dias. Aqui no bairro está tranquilo, a única coisa que soube foi do roubo de um carro esses dias”, comentou.
Lúcia de Fátima disse que a paralisação dos policiais militares “é ruim”, mas não criticou a atitude. “Eu levo bolo e café para os policiais aqui perto todos os dias há mais de um ano. Eles merecem”, disse. Todo mundo tem o direito de reivindicar. Os professores vão às ruas protestar, os servidores em geral vão, por que os policiais não poderiam também?”
A opinião é diferente daquela de Ervino Nitz. “Acho isso tudo uma falta de respeito com a população. Nunca vi nada parecido na minha vida, nos deixaram à própria sorte com os bandidos”, reclamou.
Sebastião Guimarães também criticou a paralisação. “Vai normalizar só quando a polícia entender que a segurança é necessária. Não dá para deixar a população à mercê dos bandidos. A polícia não pode nos abandonar. Imagina se a população começar a se armar o que pode acabar acontecendo.”
Cemitérios cheios – Mais de 100 pessoas morreram na Grande Vitória desde o início do motim da Polícia Militar no Espírito Santo, no sábado, dia 4. De acordo com o presidente do Sindicato dos Policiais Civis (Sindpol-ES), Jorge Leal, a planilha deixou de ser atualizada na manhã de quarta-feira, dia 8, quando havia 95 mortes violentas registradas.
“A estatística deixou de ser atualizada, mas já temos informações de que o número de mortes passou de 100. Isso é fato”, afirmou Leal. “As mortes não deixaram de ocorrer porque o governo fez pressão para que os policiais não divulgassem”, disse o presidente do sindicato.
Todo mundo a pé – Os ônibus urbanos foram recolhidos às garagens na manhã desta quinta-feira, 9, por determinação do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários no Estado do Espírito Santo (Sindirodoviários-ES). Os veículos chegaram a circular com frota reduzida no início da manhã, mas pelo fato de os terminais rodoviários “não oferecerem as condições mínimas de segurança” eles paralisaram novamente as atividades.
O presidente do sindicato, Edson Bastos, informou, em nota, que os militares do Exército demoraram para chegar aos terminais para realizar o patrulhamento. “Tivemos registro de dois motoristas ameaçados, além de incidente em que um ônibus foi fechado por criminosos que ameaçaram incendiar o coletivo no centro de Vitória”, afirmou Bastos.
A crise na segurança pública no Espírito Santo chega nesta quinta-feira ao sexto dia com a população ainda com muita sensação de insegurança. No início desta manhã, as ruas de Vitória apresentam mais uma vez pouca movimentação.