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Falta de fertilizantes provoca desabastecimento alimentar

A mídia comercial hegemônica, os poderes que governam o Brasil há séculos, a pedagogia colonial vendem, impõem, obrigam ao entendimento de ideologia como um pensamento oposto à sociedade, coisa de esquerdista, senão de comunistas. Mas há ideologia, como há filosofia, para explicar o mundo de modo conservador, de modo anti-humano, como também para o transformar.

A ideologia que vigora no Brasil, desde 1990, é a neoliberal, conservadora, favorável ao capital e não ao trabalho, que impõe leis que impedem o desenvolvimento do País com falácias e engodos que nos conduziram à situação de mais de 600 mil mortos, só superado no mundo por outro país onde o neoliberalismo também assumiu o poder, os Estados Unidos da América (EUA). E à situação de desemprego, de miséria, de inflação crescente, e ao conjunto de malefícios que nos agridem e que a todos atingem.

A síntese da ideologia neoliberal foi estabelecida, em 1989, por um conjunto de economistas assalariados das finanças internacionais e ficou conhecida por Consenso de Washington, por ter sido escrita na capital dos EUA.

Para relembrar e porque há obrigatoriedade de o Brasil seguir suas imposições, transcreveremos o Decálogo do Consenso de Washington:

1) Disciplina fiscal, evitando grandes déficits fiscais em relação ao Produto Interno Bruto (PIB);

2) Redirecionamento dos gastos públicos de subsídios (especialmente subsídios indiscriminados) para uma ampla provisão de serviços essenciais pró-crescimento e pró-pobres, como educação, saúde e investimento em infraestrutura;

3) Reforma tributária, ampliando a base tributária e adotando alíquotas marginais moderadas;

4) Taxas de juros determinadas pelo mercado;

5) Taxas de câmbio competitivas;

6) Livre comércio: liberalização das importações, com ênfase na eliminação de restrições quantitativas (licenciamento, etc.), proteção comercial a ser fornecida por tarifas baixas e uniformes;

7) Liberalização do investimento estrangeiro direto interno;

8) Privatização de empresas estatais;

9) Desregulamentação: abolição das regulamentações que impedem a entrada no mercado ou restringem a concorrência, exceto aquelas justificadas por motivos de segurança, proteção ambiental e do consumidor e supervisão prudencial de instituições financeiras; e

10) Segurança jurídica para direitos de propriedade privada.

Destacamos o oitavo mandamento que, ao contrário das leis de Deus – Bíblia, o Antigo Testamento: Êxodo (20); repetido no Deuteronômio (5), não proíbe o furto, mas que o Estado possa se estruturar, ter instituições para atender o povo.

No sábado, 16, o jornal O Estado de S. Paulo colocou a seguinte manchete: “Falta de fertilizante complica plantio e sinaliza mais inflação na mesa em 2022”. Nesta matéria, assinada por Márcia De Chiara e José Maria Tomazela, se lê: ‘Na semana passada, o presidente Jair Bolsonaro previu desabastecimento de alimentos em 2022 por causa da falta de fertilizantes”.

Porém, ao invés de analisar como o Brasil passou a ser dependente da importação de fertilizante, um país que tem na agricultura sua mais importante receita de exportação, o artigo dedica-se à discussão entre inflação e desabastecimento e detalhes do mercado internacional.

A sequência que se segue trata da aplicação do Consenso de Washington após o golpe de 2016.

1) abril de 2016: a administração da Petrobrás, sob comando do golpista Michel Temer interrompe o andamento do projeto da Unidade de Fertilizante 4, no norte do Espírito Santo;

2) março de 2018, ainda sob o comando do golpista Temer, a administração da Petrobrás interrompe o projeto da Unidade de Fertilizantes 5, em Minas Gerais;

3) julho de 2019, já sob o comando do presidente Jair Bolsonaro, a administração da Petrobrás, não tendo êxito na venda da unidade de Fertilizantes Nitrogenados, em implantação no Estado de Mato Grosso de Sul (Três Lagoas), abandona o projeto;

4) março de 2019, sob o presidente Bolsonaro, a administração da Petrobrás interrompe a operação da Fábrica de Fertilizantes, em Sergipe;

5) também em março de 2019, a administração da Petrobrás interrompe a operação da Fábrica de Fertilizantes na Bahia, já deixando o mercado consumidor brasileiro refém das importações;

6) janeiro de 2020, a administração da Petrobrás, também após o insucesso na venda, encerra as atividades da FAFEN, fábrica de fertilizantes localizada em Araucária, no Paraná, demitindo 400 empregados e tirando 30% da produção nacional de amônia e ureia do mercado brasileiro;

7) em agosto de 2020, o Canal Rural divulga a seguinte decisão da administração da Petrobrás: “nesta terça-feira, 4 de agosto, a Petrobrás arrendou duas fábricas de fertilizantes, na Bahia e em Sergipe, para o grupo Unigel. Com o negócio, haverá retomada de produção nas duas unidades a partir de janeiro de 2021. O acordo envolveu as fábricas de fertilizantes nitrogenados da Bahia, Fafen-BA, e de Sergipe, Fafen-SE, para a Proquigel, subsidiária da Unigel. Essa é a última etapa para a transferência de controle dos ativos, após as licenças e autorizações exigidas pelos órgãos reguladores. A diretora de Refino e Gás Natural da Petrobrás, Anelise Lara, considerou que o arrendamento está alinhado à estratégia de gestão de portfólio de capital da companhia, que concentrará os investimentos na produção de petróleo e gás em águas profundas e ultraprofundas, principalmente na camada pré-sal”.

A Unigel Luxemburgo SA (Unigel) é empresa luxemburguesa, um paraíso fiscal europeu, que recebeu, este ano, da agência de avaliação Fitch, a nota B+. A Fitch assim se pronunciou sobre as unidades recebidas da Petrobrás: “o sucesso da implantação de um novo segmento de fertilizantes pela Unigel deve melhorar seu perfil de negócios e aumentar a escala e a exposição a outro setor (agronegócio). Uma vez operacional, essa geração adicional de EBITDA pode ajudar a Unigel a reduzir sua alavancagem de forma sustentável até 2022, beneficiando seus ratings” (tradução livre).

Pode ser entendida esta rapinagem sob vários aspectos: os brasileiros ajudam a dar solvência a empresa estrangeira em paraíso fiscal (será que alguém ganhou alguma comissão?); os brasileiros não terão a mesa natalina mais sortida pois os alimentos que eram fabricados no País serão importados por falta de fertilizantes; a importação de alimentos, produto insubstituível, eleva a inflação e deixa o Brasil dependente das especulações monetárias no exterior; a soberania brasileira fica ainda menor; e os leitores podem refletir ainda mais sobre o que é a população de mais de 200 milhões de habitantes sem produção de alimentos, ainda mais com um território de mais de oito milhões de km² possível de uso para agricultura.

E por que se abate tamanha desdita sobre nossa Pátria? Pela adoção de uma ideologia absolutamente contrária ao bem estar do povo brasileiro.

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