História do sertão
Feita de barro cru, casa de Faria resiste ao tempo como velho mandacaru

Dizem que toda casa tem alma, mas a de Faria, que também tinha sua casa de farinha, tinha história. Plantada com os pés firmes no barro quente do sertão nordestino, aquela casa resistia como um mandacaru na seca: silenciosa, espinhenta de memórias, mas sempre em flor pra quem sabia olhar.
Foi o velho Sebastião de Faria quem levantou as paredes, no tempo em que homem fazia casa com a força do braço e a fé no futuro. Os tijolos eram de barro cru, moldados ali mesmo, na beira do açude que só enchia em ano bento. O telhado, de telha canal, rangia com o vento como se a casa respirasse fundo entre uma ventania e outra.
Ali, nasceram cinco filhos, três cabras e uma dúzia de histórias que a vizinhança contava de orelha em orelha. Tinha a lenda do pavão que cantava de noite no curral, o espírito da avó Donana que assobiava pela cozinha, e o dia em que choveu dentro de casa só no quarto da filha mais nova, que chorava de saudade de um amor que partiu para São Paulo e nunca voltou.
A Casa de Faria virou ponto de encontro. Cheiro de café no bule, rede esticada no alpendre e o radinho chiando forró de Luiz Gonzaga. Ali se contavam causos, se fazia promessa, se cozinhava feijão com carne seca e esperança. Os tempos mudaram, os filhos se espalharam como vento em feira, mas a casa ficou.
Hoje, envelhecida, com a pintura desbotada pelo sol e as janelas rangendo com lembranças, a Casa de Faria é mais que construção: é monumento invisível da memória nordestina. Um retrato vivo de um tempo em que a vida era dura, mas cheia de ternura.
A casa, todos sabem, nunca foi só de Faria. Era de quem chegasse com respeito, com sede de história e fome de afeto.
