Cine PE
Festival vira palanque político e ameaça desabar
Publicado
emAmilton Pinheiro
Certamente é a edição mais problemática do Cine PE, segundo sua diretora, Sandra Bertini – a 21.ª edição do festival aconteceria entre os dias 23 e 29 de maio, mas foi adiada depois que sete cineastas anunciaram a retirada de suas obras. O motivo: a participação do longa Real – O Plano por Trás da História, de Rodrigo Bittencourt, e do documentário O Jardim das Aflições, de Josias Teófilo, sobre o filósofo e polemista Olavo de Carvalho.
Em nota pública, os diretores (seis de curta-metragem e um de longa) alegaram que a curadoria do Cine PE, ao aceitar os dois filmes, “favorece um discurso partidário alinhado à direita conservadora”.
Sandra Bertini confessou sua surpresa com a atitude e contou que só tomou conhecimento do fato pela imprensa. “Organizo o evento há 21 anos e jamais esperaria por uma atitude dessas. O que realmente me surpreendeu foi a atitude daqueles diretores, que inscreveram seus filmes de forma espontânea e depois rejeitaram uma plataforma com tanta visibilidade como é a do Cine PE.”
Ela reorganizou a programação e o festival vai ocorrer entre 27 de junho e 3 de julho. Procurados pela reportagem, três curtas-metragistas e um diretor de longa preferiram não comentar o assunto. Os outros três realizadores contatados não responderam às ligações.
Para os diretores dos filmes que geraram toda a celeuma, o episódio reflete o momento de polarização e de intolerância política que o País atravessa. “Foi certamente a atitude mais imbecil e autoritária da história dos festivais brasileiros. Uma prova inequívoca de ódio e intolerância”, entende Josias Teófilo, garantindo que vai ao festival. “Agora, é uma questão de honra. As represálias contra mim já vinham acontecendo nos últimos dois anos.”
Já Rodrigo Bittencourt, que não se considera nem de esquerda nem de direita, conta que o projeto o atraiu justamente por uma grande ideia, que estava além de posturas partidárias e ideológicas: o Plano Real, adotado durante o governo de Itamar Franco. “Não é possível criticar uma obra sem vê-la, sem saber a história de seu diretor”, comenta ainda.
Para ele, os cineastas que deixaram o festival adotaram “uma atitude desleal com um colega de classe, algo que não foi generoso, nem plural”.
Bittencourt adiantou que não vai ao Cine PE por estar envolvido com as filmagens do seu novo longa. O filme Real vai abrir o festival.
A nova programação da mostra competitiva do Cine PE é formada por seis longas: O Crime da Gávea, Toro, O Jardim das Aflições, Borrasca, Los Leones e O Caso Dionisio Diaz, que substituiu O Silêncio da Noite é Que Tem Sido Testemunha das Minhas Amarguras
O Crime da Gávea, de André Warwar, já foi exibido nos cinemas e está disponível em uma plataforma de TV a cabo. Isso contraria o regulamento, que só permite obras inéditas. Isso prejudicaria também O Jardim das Aflições, que já entrou em cartaz.
Questionada, Sandra explicou: “Devido às mudanças no cronograma do Cine PE, decidimos que filme O Jardim das Aflições não podia ser prejudicado, e além do mais, ele permanece inédito nos cinemas de Pernambuco. Em relação a O Crime da Gávea, assumo que é grave, que houve um erro cometido pela curadoria ou pela minha equipe, mas vamos mantê-lo.”