O que menos interessa ao presidente da República nesses tempos de nuvens negras sobre o Palácio do Planalto é brigar com gregos, principalmente com alagoanos. Se isso ocorrer – e não está muito distante -, as nuvens tendem a se transformar rapidamente em tempestade incontrolável. A se confirmar o esperado veto ao esfomeado Fundão, o que dirão os apoiadores do governo se o chefe do Executivo se vir obrigado a vetar os quase R$ 6 bilhões para a eleição de deputados e senadores supostamente aliados em 2022. O problema é que os parceiros, representados em sua maioria pelo voraz Centrão, viram adversários e rompem a união com a mesma rapidez de casamento do século 21.
Nessa altura do campeonato eleitoral, ficar bem com o Centrão é fundamental para as pretensões do capitão. Mesmo que a ganância dos correligionários e dos amigos do momento tenha repercutido muito mal na sociedade, desagradado eleitores bolsonaristas e jogado enorme pressão nos ombros de Jair Bolsonaro. Preocupado, temeroso e, sobretudo, agindo com certa ambiguidade, o chefe da nação ora diz que vai vetar, ora acena com uma pequena redução no turbinado fundão, que nos bastidores ele teria apoiado. Por isso, a dificuldade de tomar uma decisão. Ele sabe que, além dos eleitores mais fieis, incomodará partidos e parlamentares aliados, inclusive os filhos deputado e senador.
O jogo a ser jogado é complicado e decisivo para manutenção do apoio comprado a peso de ouro e com pagamento a longo prazo. E não adianta discursos popularescos ou proselitismo. Ou veta e fica mal com o Centrão ou não terá explicações para a sociedade e apoiadores que apostaram em um governo sério e longe do famigerado toma lá, á cá. O que dizer se mantiver um fundo eleitoral de R$ 5,7 bilhões, quantia correspondente ao triplo (185% a mais) do montante definido para as eleições de 2018 e 2020 e que certamente será retirado de outras áreas carentes, entre elas a saúde? Como a cabeça do presidente lembra a de um juiz, não podemos imaginar o que dela sairá até 4 de agosto, data limite para sanção ou rejeição da proposta milionária.
Política, jurídica ou econômica, seja qual for a decisão haverá impactos positivos e negativos para a intenção de se reeleger. Vetando, agradará a maioria da população, mas improvável que evite desgates com o Parlamento, especialmente com sua base de sustentação, liderada pelo Centrão. O que ninguém diz é que, independentemente dos R$ 5,7 bilhões, não faltará dinheiro para as eleições. Restará aos congressistas aplicar a lei ou os índices da inflação e definir o montante. Vale lembrar que, na LDO de 2020, último ano eleitoral, o Congresso aprovou R$ 2,03 bilhões para candidaturas. Formado com dinheiro público, o fundão eleitoral foi criado em 2017 e tem por objetivo financiar campanhas políticas.
Foi a solução encontrada pelos parlamentares após o Supremo Tribunal Federal determinar, em 2015, o fim do financiamento privado de campanhas. Portanto, não adiantará ficar no muro. Atender os partidos e indicar fundão eleitoral de R$ 4 bilhões – o dobro das últimas eleições – é mais do mesmo. Em relação aos apoiadores, a bomba permanecerá ativada. O “jabuti” do fundão foi incluído na LDO pelo deputado Juscelino Filho (DEM-MA), relator final da proposta orçamentária para o ano que vem. Como na tragédia de Hamlet, príncipe da Dinamarca, monólogo de Willian Shakespeare, Bolsonaro terá de mostrar a cara e decidir se existe ou não existe. “Ser ou não ser, eis a questão”