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Futebol precisa valer mais do que a força do PIX alviverde

Imortal como jornalista, cronista, dramaturgo, teatrólogo e escritor, Nelson Rodrigues também se imortalizou como fanático torcedor de futebol. Ele morreu em dezembro de 1980, mas, onde quer que esteja, nunca deixa de assistir uma partida do seu Fluminense. Vestido de Noiva, de Anjo Negro, o mestre das frases incríveis dá um Beijo no Asfalto, ornamenta a Boca de Ouro, coloca nos bolsos do paletó Os Sete Gatinhos e se senta na primeira fileira da arquibancada para torcer, gritar e, às vezes, chorar pelo time das Laranjeiras. Não sei se conseguirá fazer isso na tarde deste domingo (03), no Allianz Parque, onde seu glorioso Fluminense enfrenta o italianado Palmeiras do português Abel Ferreira.

E por que não? Porque, dizem os idiotas, que o Fluminense do dinizismo vai entregar o jogo para impedir uma eventual possibilidade de o Flamengo ser mais uma vez campeão nacional. Digo idiotas pois não acredito que o tricolor carioca fará uma lambança dessas na pátria de chuteiras apenas para prejudicar um clube que nasceu de suas costelas, mas que já se fartou até das vísceras do “coirmão”. Nascemos depois, mas só de títulos cariocas são 37 e mais de dez taças Rio. Temos também oito brasileiros, quatro Copas do Brasil, duas Supercopas, uma Copa dos Campeões, três Libertadores, uma Recopa Sul-Americana e uma Copa Ouro Sul-Americana. Nada mal para encher de luz os corações e os olhos da consagrada família de 45 milhões de torcedores.

Faço coro à célebre frase de Nelson sobre as chances de os idiotas tomarem conta do mundo. “Não pela capacidade, mas pela quantidade. Eles são muitos”. Também sei que, “em futebol, o pior cego é o que só vê a bola”. Verdades verdadeiras. No entanto, pelo menos dessa vez, me permito discordar de sua excelência do esporte bretão. Embora não desacredite na força extrema do PIX de Sua Santidade Leila Pereira, a toda poderosa da Crefisa e da Sociedade Esportiva Palmeiras, acredito que no 11 contra 11 a camisa valha muito mais do que uma gravata ou do que alguns reais a mais na conta. Se isso ocorrer, o símbolo do alviverde do Parque Antártica, o Porco, tem de ser imortalizado e retirado do Jogo do Bicho, a loteria mais séria do planeta.

Assim como no dia a dia dos políticos, muitas vezes é a falta de caráter que decide uma partida. Afinal, não se faz literatura, política e futebol com bons sentimentos. Desde a tarde desse sábado (2), o aprendiz de feiticeiro tricolor Fernando Diniz vem antecipando que vai poupar alguns titulares, inclusive o artilheiro Germán Cano. Diriam os sábios vascaínos, botafoguenses e corintianos que é um direito de quem não tem mais nada a perder. Seria, não fosse a necessidade de vitória do Palmeiras. Esfarrapada e descompensada, a desculpa é o gramado sintético. Considerando que atualmente o Estádio das Laranjeiras é de pouca valia, o Allianz é mais do que uma passarela aveludada.

Na hipótese concreta de mutilação da equipe titular, que os reservas honrem a camisa verde, branca e encarnada do Fluminense. E mostrem ao técnico e à direção tricolor que, vivo ou morto, cada um dos 203,1 milhões de brasileiros já foi Flamengo por um instante. Dita por Nelson Rodrigues, a tese sobre a nação rubro-negra precisa ser respeitada. Meus caros atletas do birrento Diniz, percam jogando futebol, mas não se entreguem às forças ocultas. Palmeirenses e tricolores não se esqueçam que o Flamengo é uma força da natureza. “Quando o Mengão espirra, é o futebol brasileiro que fica resfriado”.

Consciente da leveza do conjunto do Palmeiras, até acho que o Flamengo não merece o bicampeonato. Foi demais perder para Bragantino, Cuiabá, Botafogo, Santos, Atlético Mineiro e Internacional, os três em casa, e empatar no primeiro turno com o América Mineiro. Coisas dos senhores do futebol. O que os deuses não perdoam é a entrega mediante a mala preta ou verde e branca. Oxalá os idiotas estejam errados. Tomara que seja mais uma daqueles fake news dos tempos de Bolsonaro, para quem Lula transformaria rapidamente o Brasil em uma Venezuela. Travestido de treinador de seleção, o técnico do Fluminense se antecipou a Lula e fez pior. Hoje, o escrete brasileiro não mete medo nem na Bolívia. Que Nelson Rodrigues esteja sentado atrás das traves do goleiro do Fluzão.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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