Garibaldo, o Gari, como os mais próximos o chamavam, tinha a mania de se passar por torcedor de qualquer time, por mais improvável que fosse. Tanto é que, não por acaso, ele fingia ser torcedor de qualquer clube, por mais improvável que fosse. Os amigos o acusavam de ser o mais notório estelionatário das torcidas organizadas. Verdadeira fraude ambulante, que transitava com a maior cara de pau sem nem mesmo piscar diante de possíveis confrontos.
— Gari, como é que você é torcedor do Fluminense, se na semana passada você estava cantando o hino do Vasco?
— Eu? Tá maluco?
— Não lembra? A gente estava com o Lúcio no bar do Onofre.
— Ah, tá! Fiz aquilo pra ele ver que o hino do Vasco é fraquinho perto do meu Fluzão. Sou tricolor de coração…
O gajo, que de bobo não tinha nem a cara, dependendo da situação, poderia se tornar até torcedor do praticamente falecido América. Foi assim com o seu Calixto, provavelmente um dos últimos apaixonados pelo time da Zona Norte do Rio de Janeiro. Isso aconteceu porque o Garibaldo, sem grana para pagar o aluguel, foi pedir um prazo para quitação para o dono do imóvel.
— Pois é, seu Calixto, se eu te contar, o senhor não vai acreditar.
— O que foi, Gari?
— Bem, não sei se o senhor soube, mas perdi o meu avô na semana passada.
— Meus sentimentos.
— Obrigado. Só que eu tive que arcar com os custos da funerária.
— Hum. E daí?
— E daí é que fiquei meio apertado para pagar o aluguel pro senhor.
— Gari, uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Se você não tem o dinheiro, vou ser obrigado a pedir para que você desocupe a quitinete.
— O senhor está certo. Vou tentar vender a camisa do time do vovô. Aliás, do meu avô e meu também.
Nisso, Garibaldo retirou o casaco e, então, Calixto, olhos marejados, percebeu que o inquilino está trajando a camisa do América. Emocionado, o velho encarou o rapaz e disse:
— Gari, meu filho, vou dar um prazo para você pagar. Vê se consegue me pagar o aluguel até o mês que vem. Pode ser?
Garibaldo, com o sorriso mais cínico do mundo, abraçou o Calixto. Em seguida, entrou no apartamento se coçando todo, retirou a camisa do América e a depositou bem no fundo da gaveta. Não demorou, começou a resmungar.
— Maldita alergia à naftalina!
*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.
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