Geraldão não perdoava nem os parcos fios de cabelos brancos do seu avô, cuja generosa careca necessitava de um chapéu de palha para não queimar a cútis sensível. E se o homem não demonstrava compaixão com o ascendente, imagina o que não fazia com os demais infelizes que se atreviam a cruzar seu caminho.
O homem, que fazia alguns bicos de segurança em boates e na mais afamada casa inapropriada de uma Região Administrativa do Distrito Federal, cuspia marimbondos por qualquer besteira. E nem adiantava fazer reclamação na gerência, pois a polícia recebia o devido quinhão. Além do mais, Geraldão andava de caso com dona Dirce, proprietária da tal casa da luz vermelha, que era frequentada até por gente poderosa.
Se nas boates os frequentadores costumavam se exceder por conta de bebida; no lupanar, de vez em quando, aparecia um caloteiro. E foi justamente o que aconteceu naquela noite de sábado, quando um rapazola contratou os serviços da doce Judite. Aliás, não só contratou, mas usufruiu e, como menino diante de pote de mel, lambuzou-se todo.
Marcolino, o tal rapaz, era conhecido por ser o caçula do seu Francisco, rico fazendeiro. Já deu para perceber que ao freguês não faltava dinheiro, mas ânimo para pagar pelo trato. Ele, todavia, alegava que faltava a Judite cumprir algo do acordo, o que a profissional negava veemente. E, para resolver a contenda, dona Dirce foi chamada.
— Não pago!
— Marcolino, conheço seu pai desde bem antes de você nascer. Então, você paga!
— Não pago!
— Olha, tá vendo aquele guarda-roupa ali no canto?
— Hum!
— Pois bem, ele se chama Geraldão.
— E daí?
— Ou você paga o que deve ou, então, ele vai ter uma conversinha com você.
— Não pago!
O que aconteceu em seguida, ninguém sabe ao certo. Todavia, parece que a Judite recebeu seu quinhão. Quanto ao Marcolino, desde a tal conversa que teve com o Geraldão, só paga adiantado. É que o namorado da dona Dirce é mais grosso que cintura de sapo.
*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.
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