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Golpe de alguns, se confirmado, representará o caos para todos

Com as bênçãos dos apóstolos Braga Netto e Augusto Heleno, a penúltima semana de agosto começa para o mulá Bolsonaro exatamente como terminou a penúltima: preocupantemente tranquila para o país e desesperadoramente beligerante para o governo sob seu desastroso comando. Sãofranciscanamente, diria que é chegado o momento de levarmos a paz onde só se respira ódio. Ocorre que o Cramunhão, primo-irmão do Capiroto, resolveu fixar morada na Praça dos Três Poderes e deve permanecer estimulando a refrega entre o poderoso sem noção de um lado e os poderosos de toga de outro. É bom lembrar que, de tanto apanhar e se defender, suas excelências togadas decidiram partir para o ataque.

Após semanas engolindo ameaças e xingamentos randômicos e dignos de mesa de botequim, do tipo sua mãe não é homem, substituíram os termos em latim pela ortodoxia do palavreado de estádios de futebol. Seus líderes deixaram de lado o espírito pacificador e optaram por mostrar aos brasileiros que o Brasil tem leis e que elas têm de ser cumpridas. Simples assim. Não tenho provas, mas as histórias que me chegam dão conta de que, nos bastidores de determinados palácios do Judiciário, do Legislativo e do próprio Executivo, essa mudança de percurso tem forçado o novo mulá brasileiro a viver permanentemente com o alerta vermelho ligado. Sem noção do perigo e com a razão bem próxima da sola do pé esquerdo, teme que o volume de inquéritos no STF, aliado à pressão externa, incluindo a do poder econômico, obrigue o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), a desengavetar um dos 120 pedidos de impeachment.

É uma possibilidade remota, mas, se ocorrer, a Inês estará tão morta como o voto impresso, cujo atestado de óbito foi assinado por opositores, ex-aliados e até aliados insatisfeitos. O bolsonarismo raiz sabe que, embora distante, surgida a hipótese de impedimento, nem o fumacê de canhões, os berros de generais de pijama ou gritinhos histéricos de empoeirados sertanejos conseguiriam reduzir a voltagem da cadeira elétrica. Esses mesmos apoiadores também sabem que a fabricação de crises institucionais, além de não convencer mais ninguém, está empurrando o país para um abismo cada vez mais negro. A crise não é mais minha ou sua. É nossa. A prioridade do presidente e de seu círculo deixou de ser o país e suas mazelas. Reeleição a qualquer preço é que interessa. O resto não tem pressa.

O caos sanitário, a temida inflação, os elevados preços dos gêneros de primeira necessidade, o desemprego e a fome não incomodam mais a família Bolsonaro, tampouco seus seguidores fanatizados e emburrecidos. O aumento diário da gasolina, do álcool e do óleo diesel não impedirá apenas a circulação dos esquerdopatas. Seremos todos atingidos. É preciso que entendamos definitivamente que, esquecidas as reformas que poderiam gerar algum crescimento, o governo do desenxabido líder talibã chegou à fase da queima de estoque. Enquanto isso, o dia do golpe está marcado para 7 de setembro, Dia da Independência. Passarei o feriado em família, com filhas e netos, provavelmente degustando algumas brahminhas da Skol e certamente visitando o water closed a cada hora para tentar expelir o medo dos fundamentalistas ensandecidos ou endinheirados (talvez as duas coisas) que prometem tomar as ruas do Brasil.

Tudo é possível nessa quadra da vida. Impossível é vislumbrar alguma normalidade, alguma sapiência no presidente da República. Se depender do general Hamilton Mourão, do ministro Luiz Fux, do senador Rogério Pacheco (DEM-MG) e do já citado deputado Arthur Lira,  o Brasil continuará respirando ares absolutamente democráticos. Mais importante é saber que os quase 70% de brasileiros que não acreditam mais no bolsonarismo como algo sério não estão recolhidos com medo do golpe. A maioria está convicta de que, quando setembro chegar, as pedras talvez comecem a rolar ladeira abaixo. Eu sou um desses. E, antes que alguém pergunte novamente, minha ideologia é a família. Não tenho vínculos petistas, muito menos tucanos, pepistas, emedebistas ou pedetistas. Abomino a corrupção, os corruptos e os maluquetes. Portanto, torço, como sempre fiz, por um Brasil governado de forma séria e sem divisões.

Sertanejo sem shows e agora sem amigos, Sérgio Reis criou (?) a melhor resposta que, juntos, poderemos dar a Jair Messias Bolsonaro e seu califado sem barba: “Se você pensa que meu coração é de papel não vá pensando, pois não é”. Para arrematar, lembremos Vanessa da Mata na canção Boa Sorte. “…Acabou, boa sorte. Não tenho o que dizer. São só palavras. E o que sinto não mudará”. Força poderosa, a mente nos escraviza ou nos fortalece. Tenhamos em mente que apenas alguns querem e torcem pelo golpe. O problema é que, se ele vier, todos experimentaremos o caos. A escolha é nossa. Faça a sua.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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