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Justiça de mãos dadas

Governo bolsonarista das fake news vira triste e insólita piada

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Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo - Foto de Arquivo

Durante um período da recente política nacional, mais precisamente entre o impeachment de Dilma Rousseff e a eleição de Jair Bolsonaro, confesso que quase atingi o desencanto com a política brasileira. O que parecia apenas uma fase de declínio clínico, por pouco não evoluiu para uma internação psiquiátrica, algo como uma camisa de força em um paciente mentalmente terminal. Tudo isso porque, após lembrar de minhas incursões públicas contra a ditadura, sobretudo as manifestações pelas eleições diretas, cheguei a achar que, fora do centro-direita, não teríamos solução. Foram longos meses desacreditando de todos aqueles que insistissem nos pacotes de discursos anticorrupção. Como disse o poeta Belchior na canção Divina Comédia Humana, vivia mais angustiado do que goleiro na hora do gol.

Em 2018, não votei em Bolsonaro, mas optei pelo descrédito a Fernando Haddad. Ou seja, mesmo contra meus princípios de cidadão, votei em branco. Como me omiti, fui obrigado a aceitar a maioria de votos para o capitão como a vitória da democracia. E foi, queiramos ou não. No entanto, bastaram algumas semanas de mandato para que eu voltasse a ter certeza de que, apesar dos erros pontuais da esquerda ou de alguns de seus membros, a direita ou qualquer um de seus integrantes não me representam. Na verdade, jamais me representaram. Política são fatos. E os fatos do governo Bolsonaro são terríveis, absolutamente antidemocráticos, os piores da história republicana. Por isso, ainda que nunca tenha me associado às teses bolsonaristas, me penitencio – e me penitenciarei sempre – por um dia ter achado que pudesse ser palpável um governo provinciano e distante do povo.

Obviamente nem tudo foram flores nos governos do PT. Pior foram os espinhos que afloraram na administração de Michel Temer. E todos tinham nome, sobrenome e CPF. Alguns surgiram donos de frigoríficos. Outros dispunham de malas abarrotadas de dinheiro sob a cama. Entretanto, nada igual ou parecido com a era Bolsonaro, onde tudo é falso, a começar pelo próprio presidente. Por exemplo, a doentia mesmice dos discursos nos faz crer que o verdadeiro problema é o absoluto desconhecimento do verbo governar. Os ministros do STF Alexandre Moraes e Luiz Roberto Barroso, o sistema eleitoral e os governadores e prefeitos que tomaram medidas de combate ao Coronavírus são os únicos problemas de um país cheio de rachadinhas e que caminha celeremente para o precipício. Não temos dignidade, respeito, água, luz nem dinheiro para sobrevivência. Talvez falte brasileiro até para roteirizar o caos que se avizinha.

No governo das fake news, a falsidade oficial extrapola as cercas e as grades dos palácios e alcança os blogs e sites bancados com recursos públicos. No Dia da Independência bolsonarista, os milicianos da internet divulgaram imagens de 2016 para ilustrar ruas lotadas como se fossem as do dia 7 de setembro. São amadores demais, pois deixam rastros até em mentirinhas digitais. Sem contar a absoluta inabilidade de gestão. Por essa e outras razões, notadamente as de cunho golpista, nenhum eleitor com um mínimo de sensibilidade apostaria dez tostões na continuidade administrativa do Jair. Política também não é matemática, mas, se tomarmos por base os números de hoje, as eleições de outubro de 2022 já tem um perdedor: Jair Bolsonaro, cujo governo que nunca existiu acaba de acabar.

Querem prova maior do que as manifestações do 7 de setembro, quando o presidente foi para matar ou morrer. Ele perdeu e, por isso, deveria começar a trabalhar para, no mínimo, garantir uma mensagem digna em sua lápide. Perdeu a compostura, a liderança e o respeito interno. O externo não tem faz tempo. Nesse ano e meio que lhe resta de mandato poderia pelo menos honrar os votos dos fanáticos que acreditaram em suas loucuras. Como? Governando e esquecendo de vez os votos que nunca teve. Como político ultrapassado que provou ser, hibernar no interior de sua própria carapuça napoleônica talvez seja a melhor saída. Quem sabe daqui a algum tempo consiga retornar recuperado e em condições de disputar novas funções públicas.

Por enquanto, a medicina dos normais recomenda retiro forçado como uma das soluções para sua melhora psíquica. Outras duas ele mesmo propôs: sair morto ou preso. Ao contrário de sua forma beligerante de agir, nenhum brasileiro deseja um fim extremo para sua carreira. Sobre a prisão, o problema é exclusivamente dele. Quem procura acha. Só para lembrá-lo, antecessores acharam, penaram, passaram noites no castigo e, tudo indica, aprenderam. Mais recentemente, vários de seus associados do cercadinho tiveram o mesmo fim. É a prova de que há juízes em Berlim e no Brasil. Lembremos de que nada como um dia atrás do outro. Embora haja sempre uma noite no meio deles, o dele está bem próximo. No Brasil e no mundo de hoje, as duas justiças – a de Deus e a dos homens – andam de mãos dadas. Quando uma tarda, a outra não falha. Se tem dúvida, pague para ver.

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