Especialistas e parlamentares defenderam a ratificação da Convenção 190, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), para enfrentar atos de violência e assédio no ambiente laboral. Eles participaram de audiência pública da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Câmara dos Deputados nesta semana.
A Convenção 190 é o primeiro tratado internacional a reconhecer o direito de todas as pessoas a um mundo de trabalho livre de violência e assédio. O texto busca ampliar os conceitos relacionados à violência e ao assédio no trabalho, apontar o papel dos empregadores na prevenção e eliminação desses problemas e estabelecer medidas práticas para lidar com casos de violação. Dentre os países da América Latina, três já legalizaram o acordo: Equador, Uruguai e Argentina.
A convenção entrou internacionalmente em vigor em 2021, mas no Brasil ainda depende de ratificação. Para isso, precisa passar pelo Congresso Nacional, onde tramita na forma de mensagem de acordo internacional (MSC 86/23).
No momento, o texto está na Comissão de Relações Exteriores da Câmara, onde é relatado pela deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS). Mas ainda precisa passar por uma série de comissões antes de ir a Plenário.
A secretária nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres do Ministério das Mulheres, Denise Mota Dau, vê a aprovação do tratado como uma das maneiras para diminuir os números de violência e assédio no mundo do trabalho, pois, segundo ela, faltam políticas públicas que protejam os trabalhadores contra esses crimes.
“A dificuldade de denunciar e comprovar essas violências devido à ausência de mecanismos efetivos de prevenção e enfrentamento de violência no trabalho é grande. Ou porque faltam processos que regulamentem e coíbam os agressores na manutenção dos espaços de poder, ou porque não há uma consciência de que o enfrentamento à violência no trabalho ajuda a tornar o ambiente de trabalho mais humanizado e mais saudável”, afirma.
Gênero
A deputada Erika Kokay (PT-DF) mediou a audiência pública e disse que, apesar de as violações acontecerem com homens e mulheres, é perceptível fazer um recorte de gênero a partir dos dados.
“Tem razão a Simone de Beauvoir, que disse que, quando se tem uma crise, ela atinge todo mundo, mas ela atingirá sempre de forma mais intensa as mulheres. E que, se tem uma crise, os primeiros direitos vulnerabilizados são os das mulheres”, declarou.
Uma em cada três mulheres afirma ter sofrido algum tipo de assédio sexual no ambiente laboral. Mais de 743 milhões de homens ou mulheres já sofreram assédio moral ou sexual enquanto estavam em seu local de trabalho, de acordo com a OIT.
Segundo a diretora do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho, Rosângela Silva, o baixo número de agentes públicos é um fator relevante para a ausência de fiscalização nos casos de violência no trabalho.
“Fazer concurso público para auditor fiscal do trabalho é uma necessidade premente em nosso país. Não adiantará ratificar a convenção se não tiver um corpo da inspeção do trabalho para fazer as fiscalizações, atuar quando necessário, efetuar um relatório, encaminhar para o Ministério Público, e o Ministério Público ingressar na Justiça do Trabalho”, salientou.
Para a representante do Fórum de Mulheres das Centrais Sindicais, Sônia Maria, é preciso cuidar também da saúde mental das vítimas de violência e assédio no trabalho.
“A situação de saúde mental no Brasil é preocupante e deve ser analisada como epidemia. Só os dados não traduzem a realidade da situação, uma vez que a subnotificação ocasionada pelo medo e por falta de acolhimento é grande.”
A deputada Juliana Cardoso (PT-SP), que pediu a realização do debate, sugeriu que os dados e os pedidos apresentados durante a audiência sejam levados para a Mesa Diretora da Câmara, em uma busca pela aprovação mais célere da Convenção 190. A parlamentar também sugeriu uma reunião com a primeira-dama da República, Janja Lula da Silva.