As recentes mudanças propostas pelo governo federal nas regras da Previdência Social indicam que a tendência será fazer com que os trabalhadores se aposentem com idade cada vez mais avançada e permaneçam contribuindo por mais tempo. A avaliação é do professor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro José Carlos Oliveira.
Especialista em política econômica brasileira, José Carlos explica que o sistema previdenciário mantém-se deficitário apesar das várias iniciativas de correção feitas até hoje. Segundo ele, os problemas não foram resolvidos, em primeiro lugar, por causa das alterações demográficas que vêm ocorrendo no país.
“O número de pessoas que nascem por família tem diminuído de forma acentuada. Com isso, a população brasileira tem percentual de idade avançada maior do que no passado, quando era grande o número de jovens entrando no mercado de trabalho. Em outras palavras, o total dos que pagavam era bem mais expressivo do que o dos que recebiam da Previdência”, disse à Agência Brasil o professor. “A pirâmide demográfica [na qual a base são jovens e o topo, as pessoas mais velhas] está virando um quadrado para, depois, virar uma pirâmide invertida”, acrescentou.
Oliveira explicou que essa é uma tendência mundial, que ocorre devido às melhorias em setores como saúde e alimentação, que têm aumentado a longevidade das pessoas.
A insustentabilidade do sistema tem raízes profundas porque o dinheiro aplicado não se acumula. “Nosso sistema previdenciário é o chamado de repartição simples, que é diferente do dos Estados Unidos e de alguns países da Europa, onde prevalece o de capitalização. Aqui, tudo o que a Previdência recebe é colocado em um caixa geral para ter como destino o pagamento dos aposentados. O dinheiro que entra em um mês sai no mesmo mês, mas não para as mesmas pessoas”, explicou o economista.
Além disso, o déficit tem aumentado porque, desde a Constituição de 1988, foram concedidos benefícios a pessoas que antes não o recebiam, caso dos trabalhadores rurais e dos pescadores. “Eles recebem sem nunca ter contribuído”. O prejuízo fica maior devido a benefícios como auxílio-funeral e pensões, nas quais a pessoa recebe um valor múltiplo e vinculado ao salário mínimo. “Essa vinculação com o mínimo faz a situação, que era ruim, ficar pior.”
De acordo com o professor, nem sempre a Previdência brasileira foi deficitária. “Na década de 50, quando era dividida por áreas profissionais, e não havia um regime para todos os trabalhadores, era fatiada conforme as atividades exercidas pelos trabalhadores, como comerciários, bancários, ferroviários e trabalhadores da indústria. Cada um tinha a sua Previdência. Algumas delas eram superavitárias, porque eram de categorias pequenas e com muita gente nova contribuindo. Além disso, era comum que a contribuição do empregador fosse maior do que a do empregado, mas isso só foi sustentável graças à estrutura demográfica da época [com maior número de jovens e menor de idosos].”
No sistema de capitalização adotado pelos Estados Unidos, pelo Chile e por alguns países europeus, o dinheiro depositado por uma pessoa é destinado a ela mesma, guardado para saque posterior. “O dinheiro não é usado para outras pessoas. É o que existe no Brasil, mas no caso da previdência privada. Define-se o que se quer para o futuro e vai-se pagando para obter isso. Para ser sustentável, a Previdência tem de ser de capitalização”, disse Oliveira.
Na opinião do economista, a melhor referência de transição da Previdência de repartição simples, que é a brasileira, para a de capitalização é o Chile, mas o custo é enorme. “O ajuste precisa da colaboração de todas as partes: governo, empresa e cidadãos. No Chile, foi necessário o governo vender terrenos e prédios públicos para aplicar no fundo, a fim de obter liquidez. Depois, foi dada aos trabalhadores a possibilidade de escolha do sistema no qual gostariam de estar integrados. É uma transição que dura, no mínimo 35 anos”, disse ele.
“Para que uma previdência seja sustentável, é necessário que o número de pessoas que começam a trabalhar seja maior do que o número de pessoas que se aposentam, e que não se criem novos benefícios para quem se aposenta. Além disso, é preciso que seja prolongado o tempo necessário para o início do exercício desse direito, a aposentadoria”, acrescentou.
Pedro Peduzzi, ABr