Depois do rebaixamento da nota de crédito do Brasil pela agência de classificação de risco S&P, o governo traçou a estratégia de usar a decisão para tentar convencer parlamentares a aprovar a reforma da Previdência. A medida é considerada fundamental para a sustentabilidade das contas públicas, e a demora em sua aprovação foi justamente um dos argumentos da agência para o corte da nota.
Com o rebaixamento, o Brasil ficou três níveis abaixo do grau de investimento, que é como um selo de bom pagador, que indica que a região é segura para os investidores.
As articulações políticas, no entanto, devem esbarrar no temor dos deputados de sofrerem nas urnas as consequências da aprovação da proposta de mudança na aposentadoria. “A classificação de risco que interessa à esmagadora maioria dos deputados é o risco eleitoral”, avisou o deputado Marcus Pestana (PSDB-MG).
Segundo ele, tudo vai depender, a partir de agora, da “capacidade de sedução e convencimento do governo”. A votação da reforma da Previdência está prevista para 19 de fevereiro, mas o governo ainda não conta com os 308 votos necessários para aprovar uma mudança constitucional.
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, avaliou em entrevista coletiva que a aprovação da reforma é essencial para as contas públicas, e que essa sinalização poderia inclusive levar a agência de classificação a reverter sua decisão futuramente, elevando a nota de crédito brasileira. Mas o ministro classificou como “legítima” a preocupação eleitoral dos parlamentares.
“Seria extravagante que congressistas não se preocupassem com a opinião de seus eleitores”, afirmou Meirelles, que também tem se movimentado na tentativa de se viabilizar como candidato ao Palácio do Planalto em 2018.
Um dos principais responsáveis pela elaboração da proposta de reforma, o secretário de Previdência do ministério da Fazenda, Marcelo Caetano, disse ao Estadão/Broadcast que o rebaixamento vai sensibilizar os parlamentares a aprovar ainda este ano as alterações. Segundo ele, a decisão da agência é um “fator adicional” que reforça a necessidade de mudança.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também avalia que o anúncio da S&P pode ajudar no convencimento, desde que o governo não transfira a responsabilidade do rebaixamento para o Congresso. Foi um recado a Meirelles, com quem Maia já tem duelado pelo título de candidato do governo à Presidência.
Logo após o rebaixamento, o ministro lamentou a não aprovação de medidas fiscais pelos parlamentares, o que foi entendido como tentativa de culpar o Congresso. O Planalto precisou intervir para apagar o incêndio. “Não adianta encontrar culpados e, sim, unir forças para aprovar a reforma. Esse discurso de descobrir culpados só prejudica”, avisou Maia.
A própria agência de classificação de risco chamou o Parlamento de “complacente” ao não votar medidas fiscais importantes para o equilíbrio das contas nacionais. “A demora na aprovação da reforma é um indicativo de que está faltando conversa. Agora, esse foco será reforçado pela questão do rebaixamento”, disse o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco.
O vice-líder do governo na Câmara, Beto Mansur (PRB-SP), admite que a base aliada não cumpriu seu papel como deveria. “Não diria para você que a culpa é do Meirelles ou de quem quer que seja. A culpa é nossa, que não fizemos a nossa lição de casa.”