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Ilha do Diabo e guilhotina que a todos assustava

A Ilha do Diabo, um ponto perdido no Atlântico, sempre foi uma mancha de rochas e vegetação rasteira que parecia existir à parte do mundo. Em meados do século XVIII, ela servia como um local de exílio para criminosos que a sociedade francesa decidira esquecer. Um lugar de penumbra e silêncio, onde o vento cantava como se lamentasse pelos que ali estavam confinados.

A guilhotina, instrumento de justiça da época, era uma presença simbólica que reinava como um espectro mesmo entre os muros da ilha. Ainda que raramente utilizada naquele solo, sua sombra pairava sobre as mentes dos prisioneiros, como uma promessa de que, se o esquecimento não os consumisse, a lâmina o faria. Cada prisioneiro carregava em si uma história — crimes, traições ou mesmo dissidências políticas que os levaram àquele lugar de desterro.

Havia um homem, em especial, cujo drama era conhecido por todos. Chamava-se Louis Armand, um ex-oficial do exército que havia caído em desgraça por conspirar contra a coroa. Sua presença era marcada por uma dignidade silenciosa, que intrigava e inspirava seus companheiros. Ele caminhava pela ilha como se ainda estivesse em um campo de batalha, ereto e atento, mas com os olhos carregados de saudade e arrependimento.

As noites na Ilha do Diabo eram opressivamente escuras, e o mar parecia um cemitério sem fim. Os prisioneiros dividiam celas insalubres, onde ratos eram companheiros constantes e a umidade tornava os ossos pesados. Entre eles, circulavam histórias de fugas impossíveis e de monstros marinhos que devoravam os que tentavam escapar. Louis, porém, não se entregava à desesperança. Ele costumava repetir, quase como um mantra: “A liberdade mora primeiro na mente; é lá que devemos conquistá-la.”

No entanto, o dia da sua execução chegou como um golpe inevitável. A guilhotina, trazida à ilha em uma embarcação especial, foi montada ao amanhecer. Os prisioneiros foram obrigados a assistir, e o silêncio que se seguiu ao último discurso de Louis foi ensurdecedor. Antes de sua morte, ele declarou: “Podem levar minha vida, mas não meu espírito. Sou livre, mesmo aqui.”

A lâmina caiu, e com ela, algo mudou na ilha. Louis tornou-se uma lenda entre os prisioneiros, um símbolo de resistência e dignidade. Os anos passaram, e a Ilha do Diabo continuou sendo um lugar de dor e esquecimento, mas as palavras de Louis ecoaram entre as paredes das celas, alimentando uma centelha de humanidade em um ambiente que tentava a todo custo apagá-la.

Hoje, ao visitar os resquícios da Ilha do Diabo, pouco resta da guilhotina ou das celas. Mas o vento que sopra entre as ruínas parece carregar os murmúrios de um passado que não quer ser esquecido. E, talvez, entre esses murmúrios, ainda se ouça a voz de Louis Armand, lembrando que a verdadeira liberdade é aquela que nenhum tirano pode roubar.

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