Notibras

Informação truncada gera mais dor de cabeça que fake news

Tradutor da alegria, do prazer e das gargalhadas do cotidiano profano, bizarro e engraçado, costumo deixar as mazelas, o vampirismo e as dores do mundo para os colegas obrigados a produzir desgraça para os noticiários popularescos das emissoras de rádio e televisão. Sou como o imortal Wilson Simonal, o rei do swing (não a suruba) e criador, junto com o maestro Erlon Chaves, da Banda Veneno, para quem o grande lance sempre foi rosetar. Normalmente me dou mal, mas não me canso de tentar.

Dia desses, deparei-me com uma dessas “gostosas” na academia. Indaguei do treinador Dari Valenzuela que máquina deveria usar para impressionar a moça. Dari me olhou de cima a baixo e respondeu: “Eu tentaria o caixa eletrônico no fim do corredor”. Estou até hoje de mal com o teacher.

Às vezes, entro em furadas dignas do anedotário dos velhotes. Em uma tarde ensolarada do Novembro Azul, parti para o consultório de um urologista indicado por um amigo surdo. Eu havia pedido o endereço de um médico entendido em furico, mas, acho que, por má comunicação, o tal amigo me encaminhou para o escritório de um advogado especializado em varas.

Não sabendo do mal-entendido, adentrei a sala do causídico e fui logo informando que estava com dores no ovo esquerdo. Sem me alertar sobre o erro de doutor, o advogado disse que era formado em direito.

Aborrecido, saí da sala resmungando a respeito do exagero da especialização: Meu Deus, agora tem um médico para cada ovo. Coisas da informação truncada.

Lembro de meu avô e de minha avó assistindo um desses programas televisivos de cura. De olhos fechados, o pastor presbicheriano pediu que eles colocassem a mão na TV e outra na parte doente. Minha avó colocou uma na tela e outra nas costas, enquanto meu avô levava a segunda mão às partes íntimas, hoje também conhecida por bilau em desuso. Com o carinho de sempre, a velha foi com os dois pés no saco do veio: “Idiota, ele disse que vai curar os doentes e não ressuscitar os mortos”. Morreram e nem no céu se falam.

Informar pela metade realmente não é o melhor caminho, principalmente quando a referência são o avô e a avó, entes tão queridos. Pior é lembrar deles com remorso. É o meu caso.

Certa feita, me aproximei da cama de meu avô e pedi para que ele fechasse os olhos um pouquinho. “Mas por quê?”, perguntou o veio. Fingindo inocência, respondi sem rodeios: – É que mamãe disse que quando o senhor fechar os olhos nós vamos ficar ricos.

Ainda hoje, o mais difícil é esquecer o safanão.

Com o boi na sombra, engraçado e bem-humorado até em missas de sétimo dia, meu vô era português de berço, mas se achava mineiro das Gerais. Segundo ele, os das Minas eram mais prepotentes. Numa de suas andanças pelas ruas suburbanas do Rio, encontrou um amigo cuja naturalidade era desconhecida. Ao saber que o companheiro nasceu em Pelotas, seu Araújo perdeu a oportunidade da piada: “Eu nasci interim, duma veis só”.

Antes que alguém pense que minha vida é baseada em um texto inacabado ou em uma desgraceira, melhor informar que, de vez em quando, jogo no bicho e acerto no milhar da perereca. Em um fim de tarde inesquecível, passei em frente a uma casa de saliência de péssima reputação. Aos berros, uma das moças perguntou por que eu não experimentava. Disse que não podia mais.

“Ânimo, entre e vamos tentar”, brincou a profissional do vuco vuco. Entrei e, sem descanso, atuei três vezes como um jovem de 19 anos incompletos. “Caramba! E o senhor disse que já não podia!”, resmungou a professora substituta. Meio sem graça, disse quase silenciosamente: – Você entendeu errado. Transar eu posso. O que eu não posso é pagar!

Mesmo com o joanete à flor da pele, tive de pular a janela para fugir da surra com toalha molhada.

Outra surra da qual me safei por conta do entendimento às avessas foi em um vagão do Metrô de Brasília. Era fim de semana, o trem meio vazio, sentou-se à minha frente um jovem do tipo punk, com cabelos multicoloridos, a maior parte vermelha, um grande topete amarelo e listras parecendo um arco-íris. Diante do exagero dos meus olhares, o rapazola grita: “Qualé, meu? Tá me tirando? Vai dizer que nunca fez extravagâncias quando era jovem?”

Sem ter o que responder de forma mais ponderada e justa, apelei para a dissimulação: – Claro que sim. Certa vez, meio papudo, fiz saliência com uma arara azul. Por isso, estava olhando para você. Achei que podia ser meu filho.

Novamente a janela foi minha salvação.

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