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Intenso, longa ‘Como Nossos Pais’ estreia nesta quinta 31

Paulo Vilhena e Maria Ribeiro integram o elenco do filme muito bem feito e intenso. Foto: Reprodução

Luiz Carlos Merten

Menos de uma semana depois de ter vencido o Festival de Gramado – no sábado, 26 -, Como Nossos Pais estreia em 126 salas de todo o País para que você possa comprovar o acerto de tantos Kikitos. Foram seis – melhor filme e direção (Laís Bodanzky), ator e atriz (Paulo Vilhena e Maria Ribeiro), melhor coadjuvante feminina (Clarisse Abujamra, o mais merecido de todos) e melhor montagem. Gramado, este ano, privilegiou a questão da representatividade – mulheres, trans, afrodescendentes. Como Nossos Pais virou emblema da questão do feminismo.

Mulheres empoderadas. O filme abre-se num almoço de família. Ao final de uma típica disputa familiar, a mãe (Clarisse) faz uma revelação bombástica. A filha (Maria) é produto de um affair. O pai não é aquele sujeito que ela aprendeu, a vida toda, a reconhecer como tal. Interpretado por Jorge Mautner, esse pai está longe de ser exemplar. É o maior 171. Mesmo assim, é um choque para a personagem de Maria. Chama-se Rosa e, durante todo o restante do filme, ela passa em litígio com a mãe, tentando reafirmar a própria identidade – como mulher, mãe, profissional.

Em Gramado, Laís e o roteirista Luiz Bolognesi assumiram que não estão mais casados, embora continuem trabalhando juntos (e sócios na Buriti Filmes). Bolognesi justificou a separação dizendo que o casamento estava empatando o crescimento de Laís. Ele também revelou que seu roteiro foi reescrito pela ex-mulher, e que ela é a autora de Como Nossos Pais. Até por esse perfil, o filme aborda muitos temas da contemporaneidade feminina, mas é basicamente sobre o choque entre mãe e filha. Desde antes da revelação que lhe retira o chão, Maria já vive em litígio com a mãe.

Acha que a personagem de Clarisse Abujamra favorece o genro, seu marido (Paulo Vilhena). Palavras de Maria: “Quando a gente tem filho, pelo menos foi assim comigo, a gente começa a questionar o jeito como foi criada. E você fala que vai fazer diferente do que sua mãe fazia com você. Mas, sem nem se dar conta, você faz as coisas parecidas.” É um pouco a tragédia do filme. Maria acha que o marido antropólogo é folgado e está mais preocupado com as tribos da Amazônia do que com a família.

Suspeita estar sendo traída por ele. Você pode achar que é demais para uma só mulher, mas ainda tem mais – e é essa complexidade que faz de Como Nossos Pais um filme rico. E, como todos anteriores de Laís, é muito bem feito, muito intenso. Muito bom.

Laís Bodanzky tem uma das carreiras mais exitosas do cinema brasileiro da chamada ‘Retomada’. Com Bicho de Sete Cabeças, ela venceu os festivais de Brasília e do Recife. Com As Melhores Coisas do Mundo, bisou o Cine PE. Faltava Gramado e ela venceu este ano com Como Nossos Pais. Seis Kikitos, incluindo filme e direção. Seus filmes diferem, mas no fundo são os mesmos.

Personagens sensíveis, histórias humanas. Um garoto que conhece o inferno do sistema manicomial (Bicho), o típico adolescente em crise (As Melhores Coisas) e o ‘tal’ feminismo (Como Nossos Pais). Todos esses filmes abordam relações de família, e o conflito de gerações. O corpo estranho, mas não é, poderia ser Chega de Saudade, sobre um clube de terceira idade.

Filha de diretor – Jorge Bodanzky, autor de um título emblemático do cinema brasileiro: Iracema, Uma Transa Amazônica -, Laís admite que pode ter feito outros filmes preparatórios para esse, mas a urgência do discurso feminista surgiu nesse momento. E não é certo que vá perseverar – o próximo filme com Cauã Reymond, será sobre a juventude de d. Pedro, o 1.º, um notório mulherengo. “Vai ser uma delícia fazer.” Vai mudar o personagem, não necessariamente o discurso. O que lhe interessa é sempre a espessura dramática. Como se não bastassem todos os problemas de Rosa/Maria Ribeiro, ainda tem mais um. A mãe, com quem ela vive em litígio, está morrendo de câncer.

É demais, mas Laís, guerreira do feminismo, não muda sua estética. O filme bate na tela com suavidade. O elenco todo, o ex-marido e corroteirista Luiz Bolognesi dizem a mesma coisa. Laís institui no set uma ditadura suave. Sem grito, mas com persuasão, ela convence todo mundo a fazer exatamente como quer. Ela acha graça da definição. A força da persuasão – seu agradecimento em Gramado não poderia ter sido mais engajado. “Somos poucas (as mulheres na direção e no roteiro), e esse é o espaço do discurso, no qual a gente coloca nossas ideias. Essa consciência é muito nova na minha vida, mas é uma reflexão necessária.

Será que nós, mulheres, não queremos dirigir nem roteirizar? Somos apenas 15% na indústria do audiovisual. Por quê? É importante refletir, porque não é que a gente não queira contar nossas histórias, mas há um filtro. É preciso romper com isso e conquistar o espaço do discurso.”

Para avançar nessa conquista, Laís teve sua tropas de choque – o maravilhoso elenco de seu filme. Foi o segundo Kikito de coadjuvante para Clarisse Abujamra, que já venceu o prêmio por A Coleção Invisível, em 2013. Clarisse é extraordinária como uma mulher madura e sensual. “Foi tudo muito rápido”, ela diz. “Laís me chamou, fizemos algumas leituras de mesa, mas o essencial já estava no roteiro.” Uma das mais belas cenas mostra Clarisse ao piano, tocando justamente Como Nossos Pais, de Belchior. “Queria o título, mas não a letra da música”, diz a diretora. “A Clarisse tocando só a versão instrumental foi um achado. Saiu muito melhor do que imaginava.” E Paulo Vilhena, trazendo para a realidade a luta de seu personagem antropólogo – em Gramado, ao receber seu Kikito, ele bradou “fora, Temer e viva a Amazônia”, criticando o presidente por extinguir a reserva e permitir a mineração. O protesto, também de Gisele Bündchen, ecoou e, na segunda, o presidente recuou.

Entrevista atriz Maria Ribeiro – Mãe de dois filhos – João Betti e Bento Blat -, Maria Ribeiro explica por que a conquista do Kikito de melhor atriz teve um gostinho muito especial.

Como foi vencer em Gramado? – Havia uma expectativa muito grande de toda a família. Meus filhos fizeram a maior festa. Afinal, o Paulo (Betti) e o Caio (Blat) já tinham Kikitos, só faltava a mãe ganhar. E eu amo esse festival. Gramado começou grande, teve um período de crise, mas conseguiu se reinventar e readquirir toda sua importância. Acho muito bom que isso tenha ocorrido.

Rosa é muito forte… – Já me perguntaram se eu acho que vou ter outra personagem tão boa. Não quero nem pensar, porque senão paraliso. Mas a Rosa foi um presentão, sim. A Laís testou outra atriz para o papel, então eu não concorria sozinha. Mas, quando li o roteiro, senti que a Rosa tinha a minha embocadura. A Laís via o Saia Justa, depois até me disse que escreveu pensando em mim. Encontrei nela minha força, minha vulnerabilidade, minha sensibilidade. Foi muito intenso fazer.

Você virou polemista na TV. Como se sente? – Foi muito rico, mas quero agora curtir esse momento de pop star de cinema. É tão breve… Quando perguntam minha profissão, digo – atriz. Quero interpretar mais. Me expressar por meio de personagens.

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