Notibras

Isabel, realista, indica que estamos fadados a morrer

Não preciso florear os meus longínquos tempos de menina, mas também não desejo expor todos os podres que presenciei ao longo dos anos que se seguiram. Que fiquem guardados em algum canto ou mesmo debaixo do tapete. E, caso a curiosidade se abata sobre alguém, que vá remexer por sua conta e risco o que todos fingimos ter esquecido. Afinal, as aparências, não raro, se fazem providenciais em um mundo repleto de culpas.

Papai nunca me falava isso é errado ou certo. Ele gostava de contar histórias e, no final, deixava-nos tirar nossas próprias conclusões. Juliano, meu irmão, tagarelava ideias, enquanto eu preferia ir até o quintal de nossa casa, na região do Grande Colorado, onde me deitava no chão ao pé de uma fruteira imaginando coisas. De vez em quando, floreava, mas certas conjunturas me mostraram que a vida pode ser dura e, geralmente, é o que temos.

Com minha mãe, aprendi a degustar as amarguras da vida. Pode parecer estranho aos que imaginam que os momentos a serem lembrados devam ser os felizes. Discordo. Se fosse assim, o que teríamos para lembrar? A bicicleta que ganhamos no Natal? O primeiro beijo na boca? Prefiro recordar o dissabor do pote de sorvete carregado de lágrimas após qualquer uma das tantas desilusões amorosas.

Juliano, assim como todos os homens que conheço, é fraco. Não consegue entender como é que consigo enxergar o mundo de maneira tão pessimista. Na verdade, meu pobre irmão desconhece que as pessoas nunca estão verdadeiramente felizes. Somos meros animais permanentemente insatisfeitos em busca de prazeres efêmeros.

— Isabel, por que você é tão pessimista?

— Juliano, meu querido e amado irmão, aprenda uma coisa.

— O quê, minha irmã?

— Tirando o Elvis, todos nós já nascemos fadados a morrer.

*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.

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