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Jamir, domesticado, virou autêntico boêmio caseiro

Jamir, farrista desde rapazola, só foi arrancado da mesa dos bares após ser fisgado pela atraente Aurora, cujas curvas poderiam ser de vedete das mais afamadas, caso não estivessem quase sempre cobertas pelos panos do casto vestido. Amor ao primeiro olhar, o homem, perto de completar 40 anos, precisou se esforçar para conquistar a donzela.

Aurora aceitou o namoro e até noivou, mas com a promessa do homem largar aquela vida repleta de bebidas e sambas noite afora. De olho na belezura, jurou que, a partir daquele instante, seria um novo Jamir. Nada mais de farras. E, por mais incrédulos que fossem, os amigos não tardaram para perceber que aquilo era conversa séria.

Do emprego para casa, da casa pro emprego, não raro, sentia vontade de voltar à vida de outrora. No entanto, após cada noite debaixo dos lençóis, o gajo era novamente convencido de que o melhor era mesmo ficar em casa. E foi ficando, até que, ao completar 70 anos, ganhou um presente inusitado da mulher: uma mesa de bar e quatro cadeiras.

O homem quase desfaleceu de alegria. Recomposto, colocou o presente na sacada. E assim passava boas horas acompanhado de um copo de cerveja e um cigarro apagado no cinzeiro. Nada de fumo ou, então, o enfarto chegaria mais cedo do que o esperado. Para completar o cenário, na parede ao lado, um quadro com o escrete do Vasco campeão de 1949, sem contar a vitrola que cismava em soltar a voz inconfundível do Jamelão.

Se Jamir havia saído da boemia por décadas, ela continuava firme no íntimo do homem. Mas nada de gozá-la nos botecos e botequins espalhados pela cidade. Não mesmo! Jamir, marido domesticado, se transformou em um boêmio caseiro.

*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.

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