Jason Bourne continua supremo, mesmo com Matt Damon encarando 45 anos
Publicado
emMariane Morisawa
Jason Bourne mudou a cara da espionagem no cinema quando surgiu na pele de Matt Damon em A Identidade Bourne (2002), dirigido por Doug Liman. Ao contrário do outro famoso espião de iniciais J.B., o personagem saído dos livros de Robert Ludlum era alguém que poderia existir de verdade.
A sensação de realismo aumentou quando Paul Greengrass assumiu a direção em A Supremacia Bourne (2004) e O Ultimato Bourne (2007). Com sua câmera na mão em estilo documental e a preocupação com o que se passava no mundo, ele influenciou uma geração de cineastas de filmes de ação.
Ninguém ligou para a tentativa de manter a franquia viva quando Greengrass e Damon se afastaram – O Legado Bourne (2012), de Tony Gilroy, só tinha Bourne no nome e trazia Jeremy Renner no papel do espião Aaron Cross. Mas, agora, após insistentes pedidos do público, Greengrass e Damon estão de volta em Jason Bourne, que incorpora elementos da atualidade, como espionagem cibernética e a instabilidade mundial após a crise econômica de 2008.
Na verdade, Damon, de 45 anos, é o responsável pelos êxitos cada vez maiores nas bilheterias até o terceiro longa, que registrou mais de US$ 442 milhões. Com Jeremy Renner, O Legado Bourne teve uma queda considerável, rendendo US$ 276 milhões, a menor arrecadação da franquia.
Em Las Vegas, onde a sequência mais espetacular do longa-metragem foi filmada, o diretor inglês Paul Greengrass conversou com o jornal O Estado de S. Paulo.
É difícil manter-se em dia com a velocidade dos acontecimentos do mundo e a franquia sempre foi muito ligada no que estava se passando. Quais mudanças dos últimos nove anos realmente fizeram com que quisesse voltar a ela?
É um mundo muito diferente em relação a 2007. Na verdade, fiz uma lista de todas as coisas que mudaram. George W. Bush era o presidente, agora é Barack Obama. A Guerra do Iraque estava em seu pico, agora ela foi superada pela guerra da Síria. Os smartphones estavam começando a sair. As redes sociais não existiam. A crise financeira de 2008 não tinha acontecido – acho que essa foi a principal coisa, porque criou muita instabilidade É um panorama muito diferente.
Um dos assuntos do filme é a quantidade de informação disponível. Acha que estamos tomando decisões mais bem informadas?
Certamente, não no meu país! Existe uma sensação de que os políticos não estão no controle. E isso é perturbador. Para mim, é o que está causando a ascensão de pessoas como Donald Trump e, no meu país, o Brexit, toda essa onda de direita. Porque os políticos comuns, profissionais, não parecem estar mais no controle.
Então, alguém que oferece respostas simplistas e extremas começa a ganhar audiência.
Parece haver uma falta de confiança nas instituições, de maneira geral.
Com certeza. E os filmes da franquia Bourne refletem muito bem isso, essa paranoia, falta de confiança. Nos dois anteriores que eu dirigi, era binário: Bourne contra a CIA. Agora é Bourne contra uma série de obstáculos, a CIA, claro, mas também as empresas de mídias sociais, a comunidade de hackers. Existe uma amplitude maior de inimigos hoje em dia.
É difícil para a ficção acompanhar a realidade?
Sim. Tínhamos filmado uma trama sobre a empresa de tecnologia e a CIA, quando aconteceu o episódio entre o FBI e a Apple, que se recusou a quebrar a criptografia das mensagens do atirador de San Bernardino. Esse é um exemplo. O ritmo dos eventos é muito rápido – por isso as pessoas têm a sensação de que os políticos não estão no controle. É um período turbulento.
Por outro lado, a ficção pode alimentar a imaginação de terroristas?
Não num filme como este, que, obviamente, é para entretenimento. Claro que todo o mundo que faz cinema precisa pensar em como mostrar a violência – eu certamente penso. Nunca mostrei violência gratuita e jamais farei. Nunca exibi sadismo ou violência contra a mulher. Acredito que o público saiba qual a intenção de um filme e de um cineasta. E a maior parte das pessoas entende que os filmes de entretenimento existem para entreter. O cinema ainda é uma das grandes experiências coletivas que temos, ao lado dos esportes e da música. É importante que o filme esteja vivo e retrate o mundo onde vivemos, seria errado também ter um cinema limpinho. Mas o cinema existe também para divertir.
Muita gente tenta imitar seu estilo. Na hora de voltar à franquia, ficou com medo de não parecer original?
Sim. Mas achei que seria errado fazer diferente – e eu também não saberia como. Se era para eu voltar depois de nove anos, a abordagem tinha que ser como se fosse uma série de livros: dar aos fãs o próximo capítulo, em vez de recomeçar ou fazer diferente. Para mim, a franquia precisava de um filme de Jason Bourne que parecesse um filme de Jason Bourne.