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Quem não se comunica...

Juca vai a veterinário depois de pizza e Humberto ao churrasco

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Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Produção Irene Araújo

Humberto havia se mudado recentemente para aquele edifício quase caindo aos pedaços. De tão carcomido, boa parte dos moradores temia pelo pior a qualquer momento. No entanto, dois ou três preferiam o desabamento à visita da Defesa Civil, que, certamente, decretaria a desocupação do local. Para onde iriam, se mal conseguiam pagar as contas, já que os salários, por aquelas bandas, não eram dignos de figurar no topo da pirâmide?

A despeito de tanta penúria, era final de Copa do Mundo e, apesar do Brasil já ter sido eliminado há tempos, a paixão por futebol fez com que organizassem um churrasco entre os residentes. Juvêncio ficou responsável pela cobrança da quantia de todos que quisessem participar teriam que arcar. Nada que fizesse tanta diferença aos paupérrimos bolsos, mesmo porque a maioria já estava atolada em dívida no cartão de crédito.

E lá foi o Juvêncio bater à porta dos vizinhos. Subiu as escadas até o terceiro andar e, após breve conversa com todos daquele piso, desceu para o segundo, até chegar ao último apartamento do primeiro andar, justamente o do novo morador. O bate-papo rendeu não mais de cinco minutos, o suficiente para causar certa confusão.

— Vinte reais, né?

— Sim.

— Minuto, que vou pegar.

— Ok.

— Aqui está.

— Valeu, Humberto!

— Ah, não sei se vou poder ir.

— Mas não tem devolução do dinheiro.

— Sem problema, Juvêncio.

— Mas aconteceu alguma coisa? Talvez, eu possa ajudá-lo.

— Não se preocupe. É que o Juca, meu companheiro há quase 10 anos, não está muito bem.

Os dois se despediram e, em seguida, Juvêncio foi ao mercado para comprar as bebidas e a carne, pois o churrasco seria na manhã seguinte, um domingo. Entretanto, antes mesmo da noite dar sua graça, a fofoca já havia corrido por todo o prédio. Pois é, o novo morador vivia com seu companheiro.

Enquanto os antigos residentes discutiam aquela situação, que nem era nova no edifício, haja vista dois ou três casais do mesmo sexo viveram ali, além de outros tantos solteiros, sem contar os que mantinham bem trancadas as portas do armário. Porém, a curiosidade aguçou a mente de muitos, que conjecturavam a aparência do tal companheiro do novo vizinho.

Já na manhã seguinte, quando o samba tomava conta do ambiente enquanto a partida não iniciava, as primeiras latas de cerveja eram abertas. As apostas eram firmadas, mas nada de dinheiro, que, de tão curto, não valia o risco de ser desperdiçado por um palpite infeliz. Nisso, eis que surgiu o Humberto, com cara de quem havia passado a noite em claro. Logo se formou um círculo à sua volta.

— Bom dia, Humberto! Como está o seu companheiro?

— Ah, bem melhor!

— Que bom!

— E o que ele tinha?

— A culpa foi minha. Só dei um pedacinho de pizza, e ele teve aquela diarreia. Mas o veterinário já me passou a medicação, e o Juca está novinho em folha. Não sei como é que não tá latindo.

*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.

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