Imagine alguém mal-humorado. Agora pegue essa pessoa num dia ruim, e que esse dia seja o mais longo do ano. Pois é, talvez, assim, você possa ter ideia do que é a Margô, mulher dos seus quase 50 anos, apesar de há tempos se manter firme nos 38.
Casada com o Onofre há 30 anos, filhos mais que criados, Margô tem andado sem muita paciência com o marido. Não que ele tenha aprontado, já que, até onde a fofoca alcança, quase sempre andou na linha. Talvez seja a menopausa dando às caras.
Dona da mercearia mais popular de uma das cidades do agreste nordestino, Margô oferece produtos a preços mais em conta. Por isso, a comerciante consegue manter uma freguesia fiel, além de angariar novos compradores a todo instante. Mas nem por isso deixa de conquistar desafetos, haja vista tanta rabugice.
Pois a última vítima da Margô foi a mais nova moradora da região, a Larissa, moça formosa dos seus 19 anos. Solteira, estudante de arquitetura, a garota foi comprar algumas frutas na loja da rabugenta. Mal pisou no recinto, Larissa chamou a atenção de todos, inclusive do Onofre, que havia ido no local para pegar as chaves do automóvel com a esposa.
— Tá olhando o quê, Onofre? Perdeu alguma coisa?
— Não, amor. Só estou vendo se os clientes estão sendo bem atendidos.
— Pega logo as chaves do carro e vá logo embora. Ou você quer que eu me aborreça?
Onofre não queria encrenca e tratou de dar o pé antes que a coisa esquentasse de vez. Passou direto pela Larissa e, não demorou, já havia dobrado a esquina na direção do velho Opala da família.
A nova moradora do bairro, depois de quase 20 minutos na mercearia, se aproximou da Margô. A comerciante lhe lançou um sorriso cínico, mas que, talvez por ingenuidade, não foi captado pela Larissa.
— Senhora, posso lhe fazer uma pergunta?
— Ih, gastou uma pergunta!
Mas antes que a Larissa pudesse se sentir ofendida, eis que a Joana, antiga moradora dali, a acalmou.
— Minha filha, esta é a Margô. Uma relíquia do bairro. Seja muito bem-vinda!