BBC Brasil
Depois de chegar à investigação de oito ministros, 24 senadores e 39 deputados após delações de executivos e ex-executivos do grupo Odebrecht, a expectativa é de que a Lava Jato siga analisando depoimentos de empreiteiras – possivelmente inchando ainda mais a lista de políticos acusados de corrupção e outras atividades ilegais.
Mas há também, pelo que a BBC Brasil apurou, a expectativa de que a operação ganhe fôlego para, potencialmente, avançar por novas áreas – como o Judiciário, mais especificamente o Superior Tribunal de Justiça (STJ), e bancos e outras empresas financeiras.
Responsável por negociar acordos de delação, o Ministério Público Federal diz que as investigações podem avançar, no setor público, por todas as áreas em que houve indicação de cargos.
“Qualquer colaborador que estiver disposto a confirmar detalhes do esquema criminoso pode trazer novos detalhes e provas. Percebe-se que há loteamento de cargos por todo lugar na esfera pública, portanto, a apuração pode levar a outros setores públicos”, informou o MPF no Paraná, por meio da assessoria de imprensa.
Mas que áreas são essas? Com base em menções feitas nas delações já assinadas, nas negociações em curso e pelo que disseram à reportagem advogados e responsáveis pelas investigações, a BBC Brasil preparou a lista, abaixo, identificando potenciais próximas fontes de delações e novos alvos da Lava Jato:
Judiciário e mais políticos – Prestes a fechar um acordo de delação premiada, a construtora OAS pode aumentar o número de políticos a serem investigados e reforçar as suspeitas contra muitos dos já citados – como foi o caso de declarações dadas pelo sócio da OAS Léo Pinheiro na quinta-feira, noticiadas pela imprensa, envolvendo o ex-presidente Lula.
Há ainda a expectativa de que as delações de executivos e ex-executivos da empreiteira possam levar a operação a investigar o Judiciário, mais precisamente o Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Advogados acreditam que os investigadores devem buscar detalhes ligados à Operação Castelo de Areia, da Polícia Federal, anulada pelo STJ em 2011.
A operação havia sido deflagrada dois anos antes para apurar crimes financeiros e desvio de verbas públicas que envolviam diretores de empreiteiras e partidos políticos. O STJ, contudo, entendeu que a coleta de provas começou a ser feita de forma irregular, uma vez que a quebra do sigilo telefônico de suspeitos tinha sido fundamentada em uma denúncia anônima.
O acordo de delação da OAS começou a ser negociado ainda no ano passado, mas, por determinação da Procuradoria Geral da República, foi suspenso após o vazamento de declarações atribuídas ao ex-presidente da construtora, Léo Pinheiro – entre elas, supostas citações ao ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), como parte de um pré-acordo assinado por Pinheiro.
Para muitos, é apenas uma questão de tempo para que as investigações cheguem ao Judiciário. Para alguns, só não chegaram ainda, por causa da dinâmica das investigações.
“A Lava Jato pegará o Poder Judiciário num segundo momento. O Judiciário está sendo preservado, como estratégia para não enfraquecer a investigação”, disse, ao jornal Folha de S.Paulo , Eliana Calmon, ministra aposentada do Superior Tribunal de Justiça, ex-corregedora nacional de Justiça.
Sistema financeiro e outros conglomerados – Desde o início da Lava Jato, instituições financeiras estão na mira dos investigadores.
Ainda em setembro de 2014, Luccas Pace Junior, assistente da doleira Nelma Kodama, afirmou em depoimento ao juiz Sérgio Moro que bancos eram coniventes com as operações de lavagem de dinheiro realizadas por seu grupo. Pace, que assinou uma das primeiras levas de delações, explicou que instituições financeiras permitiam fazer operações fictícias de importação que serviam para enviar dinheiro para o exterior.
A Lava Jato também já investigou contratos superfaturados de publicidade na Caixa Econômica Federal que levaram à condenação, por exemplo, do ex-deputado André Vargas. O BTG Pactual também está entre os alvos da investigação e André Esteves, ex-controlador do banco, chegou a ser preso acusado de tentar obstruir a Lava Jato.
Nos depoimentos de executivos e ex-executivos da Odebrecht divulgados este mês, apareceu o nome do ex-presidente do Banco do Brasil Aldemir Bendine, citado por ter pedido vantagem indevida para que a empresa renegociasse uma dívida com o banco.
A princípio, Marcelo Odebrecht teria se recusado a pagar, mas que, após reavaliar o pedido, autorizou o repasse de R$ 1 milhão em três parcelas depois que Bendine assumiu o comando da Petrobras, ainda no governo Dilma Rousseff, e já com a Lava Jato em curso. A BBC Brasil não localizou Bendine nem seu representante legal para comentar as acusações.
Segundo advogados ouvidos pela BBC Brasil, as relações de políticos com instituições financeiras podem ser um novo e ainda mais explosivo capítulo da Lava Jato, caso o ex-ministro Antonio Palocci, que ocupou o Ministério da Fazenda no governo Lula e a Casa Civil na gestão de Dilma Rousseff, assine um acordo.
Palocci teria tido uma primeira reunião para discutir a possibilidade de assinar uma colaboração e sinalizou ser capaz de tratar de temas que envolvam bancos e outros conglomerados.
A expectativa é que, com uma delação de Palocci, a nova linha de investigação esmiuçaria, em particular, corrupção na área da criação de leis e normas que regulam o setor financeiro.
Agências de publicidade e marketing político – As agências de publicidade e de marketing também sempre foram um foco permanente de atenção da Lava Jato, que já abriu diferentes inquéritos para apurar a participação de empresas do tipo em crimes como lavagem de dinheiro e corrupção.
Mas o depoimento de Mônica Moura, mulher do ex-marqueteiro do PT João Santana, sinaliza que as apurações podem envolver mais marqueteiros. O casal já assinou delação premiada.
“Todas as campanhas políticas que nós fizemos. Todas. Da Polis e antes da Polis, quando eu era apenas uma funcionária de outros marqueteiros, sempre trabalhamos com caixa 2, com recursos não contabilizados. Em todas as campanhas”, disse Mônica Moura ao juiz Sérgio Moro, responsável pelas ações da Lava Jato na primeira instância, durante interrogatório na Justiça Federal de Curitiba, esta semana.
Outras frentes – Da prisão, o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha dá recados de que poderia “explodir” o mundo empresarial com possíveis delações. Advogados acreditam que, além de comprometer o governo de Michel Temer, Cunha seria capaz de detalhar, por exemplo, supostos esquemas envolvendo fundos de pensão e empresas do setor de carne.
Outro investigado que poderia colaborar com as investigações, em especial oferecendo informação sobre elos entre Cunha, Cabral e o PT, é o empresário Eike Batista. No entanto, advogados acreditam que ele tentará conquistar a liberdade por meio de habeas corpus antes de dar início a um possível acordo de delação.
Há ainda investigações em curso envolvendo a Eletrobras e empresas do setor elétrico. A própria estatal conduz uma investigação interna para apurar casos de corrupção e erros nas demonstrações financeiras da companhia.
O Ministério Público Federal, por sua vez, afirma ter identificado esquema de fraudes em licitações, corrupção e lavagem de dinheiro em contratos entre Eletronuclear e as empresas Andrade Gutierrez e Engevix para as obras da Usina de Angra 3 – que teria movimentado até R$ 48 milhões em propinas.