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Sua arma era o giz

Lembranças de Fabiana, assassinada em Juiz de Fora

Publicado

Autor/Imagem:
Carolina Paiva - Foto Acervo Pessoal/Daniel Marchi

Giz. Essa era a única arma que a professora Fabiana Filipino Coelho ousava ter e fazia questão de portar para ensinar seus alunos, sempre interessados em prestar atenção naquela mulher de não mais de um metro e cinquenta. Voz firme, mas sem perder a ternura, Fabiana tornava a matemática bem mais palatável para as turmas.

Fabiana, que era esposa e mãe, naquele fatídico dia 20 de novembro de 2019, no centro de Juiz de Fora, Minas Gerais, enquanto fazia compras para a festa de aniversário do pequeno Francisco, seu filho, foi alvejada por um disparo de arma de fogo. O autor de tal tiro, um policial militar reformado, de maneira irresponsável, atirou tentando acertar um suposto adolescente infrator em meio a uma multidão. Errou o jovem, mas acertou Fabiana. Se o homem imaginou se transformar em herói, não se sabe, mas acabou se tornando o assassino da professora.

As perguntas são muitas, mas uma em especial atormenta até hoje a vida de familiares e amigos da professora Fabiana. Era hora de agir, quando milhares de cidadãos transitavam pelo local? Uma professora estupidamente assassinada, e seu algoz vai a júri na quinta, 20.

Para conhecer um pouco mais a vítima, Notibras entrou em contato com alguns amigos e familiares de Fabiana. Glyder, um dos mais emotivos pelo assassinato da amiga, disse que “falar da Fabiana é difícil porque acabo tendo várias recordações. Mas eu vou falar o que ela era. Além de minha amiga no trabalho, era também minha amiga pessoal…. Em tudo que fazia, ela era intensa, sempre preocupada com os alunos, com os colegas de trabalho, com todos ao redor dela. Ela, o Daniel e o pequeno Francisco formavam uma família muito bacana. E como ela amava o Francisco! Ela era louca pelo filho. Era excelente mãe, apesar do pouco tempo que teve chance de ser mãe. Mas a gente percebia que ela possuía uma relação de muito carinho pelo filho…”

Já Lauriana disse que era muito difícil externalizar sua relação de amizade com Fabiana. “Eu tenho certeza que eu vou me emocionar muito. Ontem (terça, 18) eu ainda conversava com meu marido sobre a Fabi. A gente tá entrando um período de férias e eu tinha falado para ele do meu desejo de ir ao Rio para visitar o Daniel e o Francisquinho… Ainda é difícil acreditar que a Fabi partiu e mora hoje em outro plano. Todas as vezes que eu passo pela Olegário, eu a vejo, todas as vezes que eu passo pelo caminho que a gente fazia todo dia para levar as crianças na escola e a gente se encontrava. Eu vejo ela descendo com o Francisquinho, sabe? Enquanto eu deixava as crianças no colégio e subia para trabalhar e a gente se encontrava nesse trajeto. Então, essa memória é uma memória muito forte ainda no meu coração. E a Fabiana é uma pessoa incrível assim. E que eu tive um privilégio muito grande de reencontrá-la, porque eu acho que a gente tinha uma amizade de outras vidas também… uma grande amiga, uma grande companheira de sonhos e uma profissional que lutava pelos alunos, que acreditava muito na educação, na educação pública. Uma profissional exemplar e de uma generosidade ímpar, que dividia os conhecimentos dela com os professores também. Com os alunos, não mediu esforços para desenvolver os trabalhos. Então, ela é uma profissional como poucas, que acreditava muito nos alunos, na educação pública e na escola pública. Ela fez uma linda trajetória. Linda, linda trajetória com os alunos. Quando ela partiu, os depoimentos dos alunos retratavam isso, o amor que eles tinham pelo belo trabalho compromissado da Fabi, e eles conseguiam sentir isso. Uma mãe nossa, eu acho que a perda da mãe Fabiana é o que mais me aperta o coração, porque a gente tinha muitos planos para as crianças e com as crianças. A gente brincava que nossos filhos eram amiguinhos de barriga, vivenciamos também esta fase muito próxima, tínhamos planos das crianças crescerem juntos brincando também. A Fabi, o Daniel e o Francisco, eles fazem parte da nossa história e também dos nossos sonhos. Me lembro como se fosse hoje. Sim, a primeira vez que ela falou do Daniel, sua paixão pelos Fuscas, ele que veio ser seu grande amor, seu companheiro de vida, de sonhos, do desejo de construção de uma família ao lado dele. Então, fica difícil ainda acreditar que a Fabi partiu, porque os sonhos ainda vivem em nós, porque, para além da profissional, ela era uma grande amiga de todos no ambiente de trabalho, generosa e para além do ambiente de trabalho, também é uma filha exemplar, cuidava da mãe da avó. Então, ela faz muita falta, faz muita falta. Não poder abraçá-la. Não vê lá sempre no nosso trajeto de sempre. Então, eu não sei se eu consegui contribuir ou não, com minhas palavras sobre ela porque eu fico muito mexida ainda. Eu me lembro quando eu conversei com o Daniel logo após o falecimento, conversei com o Daniel e eu chorava compulsivamente. Eu ficava até constrangida perto do Daniel, que é um amigo querido também, porque ele estava lá firme, tentando me consolar, enquanto eu que deveria estar consolando. Então, é um tema que me toca muito falar na Fabi porque ainda sinto muito, um amor muito grande, uma falta enorme. Porque a gente podia ficar assim meses sem se ver e era como se a gente tivesse falado há cinco minutos. Era muita cumplicidade, era muito, muito forte. Então, é isso. Fico muito emotiva ainda sobre esse vazio que ficou.”

O disparo da arma de fogo de um policial militar reformado calou a voz da professora Fabiana. No entanto, essa mesma voz continua ecoando entre os que tiveram a oportunidade de conviver com ela. Nós, daqui de Notibras, ouvimos os apelos dos que desejam um país onde haja menos armas e mais cidadãos comprometidos como a Professora Fabiana Filipino Coelho.

 

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