A disposição da Coreia do Norte de limitar suas ambições nucleares será testada na cúpula que o ditador Kim Jong-un terá nesta sexta-feira, 27, com o presidente sul-coreano Moon Jae-in, a terceira entre líderes dos dois países e a primeira em 11 anos A aparente concessão de Kim de fechar um local de testes nucleares subterrâneos perdeu peso na quarta-feira, 25, com a divulgação de estudo de cientistas chineses que apontou o desmoronamento das instalações.
Feito na sexta-feira, o anúncio do ditador foi celebrado pelo presidente dos EUA, Donald Trump, em um tuíte no qual também afirmou que Pyongyang havia concordado com a desnuclearização, o que não corresponde às declarações de Kim. Pelo contrário. O ditador disse que suspenderia os testes por ter concluído a tarefa de desenvolvimento de seu arsenal nuclear.
A reunião pavimentará o terreno para a cúpula que Trump e Kim terão nas próximas semanas, em data que será definida em breve. Os líderes das duas Coreias se reunirão pela primeira vez do lado Sul da fronteira, em um evento que está sendo planejado milimetricamente, com ensaios prévios de cada passo. As cúpulas anteriores, de 2000 e 2007, ocorreram na capital da Coreia do Norte, Pyongyang.
Marcado para as 10h (22h de quinta-feira, 26, horário de Brasília), o encontro se estenderá até o jantar. A sobremesa será decorada com um mapa da Península Coreana unificada, algo que ambos os lados esperam obter, cada um em seus termos.
Além da questão nuclear, a agenda abrangerá a discussão de um acordo de paz que coloque fim oficial à Guerra da Coreia (1950-1953). Mas qualquer decisão nessa direção dependerá dos EUA, que assinaram o armistício que suspendeu o conflito. Moon e Kim discutirão questões bilaterais, como cooperação, ajuda humanitária e visitas familiares – cerca de 60 mil sul-coreanos têm parentes no Norte.
Isolado e belicoso nos primeiros sete anos em que comandou a Coreia do Norte, Kim usou seu discurso de Ano Novo para mandar uma mensagem de aproximação na direção de Seul. Depois de falar em “reconciliação” e “reunificação”, ele sugeriu que seu país participasse da Olimpíada de Inverno realizada na Coreia do Sul.
A mensagem foi a senha que destravou a ofensiva diplomática de Pyongyang, que teve por alvo não apenas o Sul, mas também a China e os EUA. No dia 5 de março, Kim recebeu pela primeira vez uma delegação da Coreia do Sul, pela qual enviou um recado entregue a Trump três dias mais tarde: ele gostaria de se encontrar com o presidente americano. Para surpresa de seus assessores, o ocupante da Casa Branca aceitou na hora.
Ao mesmo tempo em que acenou com reconciliação com o Sul, o ditador manteve o tom belicoso perante a audiência doméstica, afirmou Eun A Jo, editora do Asan Institute, um dos principais centros de pesquisa da Coreia do Sul. Kim mudou o dia do desfile que celebra a fundação do Exército do Povo da Coreia para fazer com que ele coincidisse com a véspera de abertura da Olimpíada de Inverno. “O objetivo era projetar força dentro do país.” Mark Tokola, vice-presidente do Korean Economic Institute em Washington, disse que 2018 será um ano de grande peso simbólico para a Coreia do Norte, que celebrará 70 anos de sua fundação em setembro. “Acredito que até lá, Kim estará bastante conciliador”, opinou.
Caso as negociações com Trump avancem, elas poderão levar a uma radical transformação na maneira pela qual a Coreia do Norte interage com o mundo e os EUA, disse Scott Snyder, do Council on Foreign Relations.
Especialista em economia coreana da Universidade Georgetown e membro do Korean Economic Institute, William Brown ressaltou que Kim enfrenta uma crise do sistema de economia centralizada e planejada, abalado pela crescente expansão das forças de mercado “Esse pode ser um ponto de inflexão que levará à mudança na natureza da economia norte-coreana.”