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Ligação por engano frustra mulheres de pensão

Três telefones presos à mesma parede do corredor daquela pensão para senhoras. Enquanto aqueles três objetos permaneciam grudados, sempre no mesmo lugar, as hóspedes, ansiosas, olhavam para o vazio na esperança de que a próxima chamada fosse para elas. Nesse silêncio, até o zumbido de uma mosca poderia ser confundido com o toque do telefone.

Alice, uma das hóspedes mais antigas, imaginava estar em um hospício. Já Ruth, que há dois dias havia sido levada para lá, não tinha a a menor dúvida. Mas outras opiniões saíam da boca daquelas mulheres, a maioria já passada dos 70, cinco ou seis beirando os 90, sem contar Clara, que insistia em permanecer sobre a terra, apesar dos 104 completados em janeiro.

Não eram maltratadas fisicamente, pois o tempo já se encarregara desse papel. Todavia, dor maior era aquela que todas sentiam: o abandono. É verdade que algumas recebiam visitas de parentes, que, aos poucos ou de modo mais ligeiro, iam escasseando até que restassem apenas datas especiais, quando muito.

— Isto é uma prisão!

— Dona Laura, aqui estão os seus remédios. A senhora precisa tomá-los.

A velha, olhos arregalados, torce os lábios e, contrariada, obedece. Bebeu meio copo d’água e, em seguida, abre bem a boca para mostrar que havia engolido tudo. A funcionária, assim que deu as costas para levar medicamentos para outras hóspedes, esboçou um sorriso com as palavras de Laura para a hóspede ao lado, Solange.

— Essa aí é uma peste!

Solange, que há tempos não falava e mal se movia, se esforçou ao máximo para concordar. Maldito AVC, que a limitou ao quase imperceptível movimento do indicador da mão esquerda. Por conta de toda essa limitação, era comum colocá-la em frente à televisão, onde era obrigada a assistir à mesma programação todos os dias. Ela sonhava em ter o controle do aparelho em suas mãos para poder trocar de canal. Melhor, desligaria aquela caixa falante e cheia de imagens distorcidas. Pobre mulher, sonhava com os dias em que possuía controle sobre suas próprias ações.

Hora para isso, hora para aquilo, hora que não era hora. Ora, vê se pode? Onde já se viu ter hora para tudo e para nada? Isso lá é vida? Até planta tem hora de abrir e fechar as flores. Ali, naquele lugar, não havia botões. Todas as pétalas já teriam caído há tempos. Há tempos! Quiçá não foram arrancadas por mãos truculentas.

Hora do pátio. A osteoporose comia solta naquele ambiente. Melhor tomar um solzinho. Era hora de relembrar tempos de praia, idas ao clube ou banhos de cachoeira. Por ali, no entanto, quando muito, um borrifador.

Aquelas velhas, algumas sentadas, outras em pé, praticamente todas com a face virada para cima tentando sentir os raios solares invadirem a alma. Momento em que se simulavam vivas. Eis que o telefone tocou. Todas se olharam, sorrisos estampados em lábios murchos.

Elizabeth, no auge dos 73, simulou uma corrida até o corredor. Não demorou, voltou para o pátio, onde ouviu várias vozes perguntando para quem era a ligação. A mulher, olhos tristonhos, voz quase muda, finalmente respondeu.

— Era engano.

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