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Lotadas de infiéis, igrejas agradam fiéis criminalizando o aborto

Foto/Divulgação

Na contramão do mundo moderno, o Brasil está mais próximo de Sodoma e Gomorra do que do paraíso vendido aos “patriotas” pelos defensores de um conservadorismo que eles mesmos abominam. Em tese, a sodomia ainda não é permitida em locais públicos, tampouco nas dependências dos parlamentos nacionais. No entanto, sob pena de castigo aos eventuais dissidentes, a ordem do dia vai além do que é socialmente correto. Com apoio das igrejas, notadamente as evangélicas, a pauta prioritária dos homens públicos é liberar geral o que é ilegal e proibir o que, pelo menos até certo ponto, é legal ou justo perante a lei.

O noticiário brasileiro é abarrotado de aberrações do tipo padres, pastores, parlamentares e prefeitos envolvidos em maracutaias das mais variadas, em acertos nada republicanos e em orgias sexuais, incluindo estupros de vulneráveis. São patifarias consideradas normais por aqueles que, no Brasil antidemocrático e pós-golpismo, querem impedir, via projeto de lei, o aborto consentido a uma mulher vítima de estupro, mesmo que ela seja menor de idade. Para os anticristos, bom é o prazer de ser feliz a qualquer custo, ainda que atropelando a felicidade dos outros.

De autoria conjunta de 33 deputados, a maioria integrante do desonrado e desqualificado Partido das Lágrimas (PL), o Projeto de Lei do Estuprador foi aprovado simbolicamente em uma comissão da Câmara com a assinatura de apenas 21 homens e 12 mulheres. Pífios e vegetativos como parlamentares, mas craques na arte da zombaria congressual, Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Carla Zambelli (PL-SP), Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) e Nikolas Ferreira (PL-MG) são alguns dos autores da infame e ignomínia proposição. O fato é que a proposta não deve ser tratada somente como irresponsabilidade de deputados e deputadas que deveriam estar se reciclando no Maternal I.

Obviamente que ela é de caso pensado. Antigos e provavelmente mercantilizados, os objetivos são cristalinos: atender às igrejas, recheadas, repito, de desditas e, sobretudo, de pastores e fiéis pra lá de infiéis. Mais radical, maquiavélico, machista e fundamentalista extremado, Sóstenes diz não se preocupar com os protestos de homens e mulheres nas ruas do país. Como líder evangélico, o deputado certamente ainda não se deu conta de que a insana e estúpida necessidade de ser diferente é o que torna homens desse naipe iguaizinhos ao que há de pior na história dos homens das cavernas. Estereótipo do primitivismo, esses tipos adoravam demonstrar força e poder puxando suas mulheres pelos cabelos.

Nome bíblico derivado talvez de “salvador de sua nação”, de santo Sóstenes tem somente a marcante presença na tropa de choque de cidadãos de péssima lembrança e que expressiva parcela do povo brasileiro quer ver pelas costas. O ex-deputado Eduardo Cunha e o ex-presidente Jair Bolsonaro estão na lista dos queridinhos do principal responsável por encabeçar a ofensiva contra o aborto legal. Na pior e mais negra fase da política nacional, sou representado por deputados federais cuja maioria, além de discriminar as mulheres, parece não gostar delas como seres humanos. Também devem detestá-las como fêmeas. Se gostassem não as exporiam ao ridículo de criminalizá-las pela prática do aborto. Pior é nada propor para penalizar os santos estupradores.

Segundo a Bíblia Sagrada, as míticas Sodoma e Gomorra, cidades situadas junto ao Mar Morto, sofreram o castigo divino destinado a todos os povos impuros e feitos a esbórnias em nome do Diabo. Seria o caso do Brasil de Arthur Lira (PP-AL), do clã Bolsonaro, de Sóstenes Cavalcante e da patriotada que vive do dízimo exigido dos pobres seguidores da barbárie religiosa? Embora não haja sodomia entre eles, certamente que sim. Digo isso sem medo de ser injusto. Já vivi o Brasil do futebol, do milagre econômico, do Direito de Nascer, da marolinha, da Ivermectina contra Covid, do racismo, da homofobia e até da misoginia oficial. Só não havia imaginado o Brasil ser “assumido” por pessoas que prezam pela cobrança de seriedade a quem os condena, mas desprezam as leis vigentes, particularmente as que podem condená-los por absurdos que sugerem e produzem.

*Armando Cardoso é presidente do Conselho Editorial de Notibras

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