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Agourentos

Lula é verborrágico, mas Javier Milei, mera ave de rapina, sairá depenado

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Mathuzalém Júnior - Foto Ricardo Stuckert/ABr

Definitivamente o presidente Luiz Inácio não é um santo. Ele também não é um exímio tomador de decisões que não firam suscetibilidades. Por questões de foro íntimo, ele tem menos limites verborrágicos do que um paquiderme ovulando. A briga pública com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, não deve servir de exemplo para futuros postulantes à Presidência da República. Nessa contenda entre o mar e o rochedo, quem se lasca é o marisco, também conhecido como contribuinte, pagador de impostos e, às vezes, como eleitor. O dólar reage negativamente a cada texto mal lido. O real se desvaloriza, a inflação cresce e o povo se aborrece.

Tudo dentro do contexto da democracia, sistema de governo em que tudo é possível, menos esconder os malfeitos. Ao contrário disso, a tirania insistentemente defendida pelos “patriotas” invariavelmente varre para debaixo dos tapetes as imperfeições, os defeitos e as maracutaias. É um espetáculo de mamulengo, no qual os manipuladores dão vozes aos bonecos da claque contratada em perfis de lanchonetes e padarias. Voltando a Luiz Inácio, não é de hoje que ele tem defeitos incorrigíveis. No entanto, não é uma anta como imaginam os quadrúpedes que o acham tão boçal como eles.

A diferença é abissal. Pelo menos, as frases, as conversas e as bravatas políticas do atual presidente não soam como as do antecessor, as quais lembravam os gritos de um vendedor de peixe podre nas feiras livres de periferia. Mesmo reconhecendo a inteligência de Lula da Silva, as aves de arribação voam do Brasil para os Estados Unidos e para a Argentina, mas não esquecem que o ninho a ser derrubado é o dos chamados heróis da resistência. Como aves de agouro, elas seguem os ensinamentos urubu-rei, se concentram em grandes bandos e estão sempre prontas para regurgitar a peçonha do líder sobre aqueles que permanecem dispostos a lutar pela democracia.

O último pouso dos agourentos foi na Argentina de Javier Milei. Obviamente que a pedido de patriotas sombrios e sinistros, o presidente argentino está negociando a alma, a imbrochabilidade e as madeixas para tirar Lula do sério e levá-lo para o ringue. Aliás, ele tentar seguir o exemplo do ex-presidente do caos brasileiro, cuja obra inacabada começou a ser derrubada no início de 2022, quando falou, ameaçou e rebolou sozinho no fictício octógono eleitoral. Perdeu, não aceitou, não aceita e agora usa Deus e o Diabo para tentar se mostrar como um anjo da paz. Alguém precisa avisá-lo da ineficácia do uso diário do uniforme de patriota bonzinho e preocupado com o futuro da nação.

Se um dia convenceu meia dúzia de inocentes úteis, hoje não convence nem a madre superiora do desativado convento de Curicica. É por isso que ele tem se valido da incapacidade mental de Javier Milei para estimulá-lo contra Lula da Silva. A ordem expressa é desconstruir, desconsiderar e desrespeitar o Brasil como nação livre de extremismos. O que o governante do gigante adormecido chamado Argentina ainda não percebeu é que atualmente quem dá as cartas no continente não é um fantoche. É um direito de Milei não querer receber Lula em Buenos Aires. Vir ao Brasil para se avistar com Jair também, desde que respeite a diplomacia bilateral.

Que ele saiba, porém, que a recíproca em breve será verdadeira. O que Milei não pode é deixar de reconhecer que foi Luiz Inácio quem, em maio, enviou para os portenhos – leia-se Javier Milei – um navio com 44 milhões de metros cúbicos de gás liquefeito para minimizar uma súbita escassez de combustível naquele país do Prata. Além de reativar a atividade industrial da Argentina, o Brasil de Lula evitou que milhares de argentinos morressem de frio. Isso os “patriotas” e Javier não contam. Pior é eles esconderem dos hermanos que uma eventual expulsão do embaixador de um país que está a um sopro do despenhadeiro pode resultar em uma catástrofe irrecuperável. Insistam e verão o que Diego Maradona não viu e Neymar um dia verá.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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