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Café com um amigo

Lula paz e amor, sem catarata, mantém cetro e caneta na mão

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Autor/Imagem:
José Seabra - Diretor Editor/Foto Amigo Garçom

Acostumado a recolher-me cedo, menos pelos cabelos brancos e mais pelo peso da idade que carrego nas costas, aceitei na noite do finado sábado, 21, convite para um café com um velho amigo que hoje ocupa uma cadeira na Esplanada dos Ministérios. Recuamos no tempo, hora do saudosismo da antiga Cabana do Pescador, ali por trás do Clube da Imprensa, às margens do Paranoá, mas a conversa ficou mesmo em torno dos acontecimentos dos últimos 20 dias, com pinceladas do início deste século. Mais ouvi e pouco falei. O que se disse transcrevo a seguir.

Lula acaba de provar, com a demissão sumária do comandante do Exército, que está com as rédeas do governo nas mãos. Nesta terceira passagem pelo Palácio do Planalto, manterá a linha paz e amor, desde que não haja sinais de traição, de desobediência. O presidente sabe que não precisa ter diploma de faculdade para mostrar o que é. Ele é diplomado na escola da vida, pós-doutor em política e coroado pelo povo.

O episódio que fez Júlio César trocar quatro estrelas por um pijama indica que falará curto (até para preservar suas cordas vocais), mas grosso. A cada frase deixará claro à equipe que as arestas que surgirem a partir de agora deverão ser aparadas imediatamente. A ordem é evitar curtos-circuitos. Caso contrário, o mal será cortado pela raíz.

O que o presidente menos deseja, confidencia esse interlocutor de longos anos, é ter a imagem do seu governo arranhada por garras de gatos engalfinhados num mesmo balaio. E isso vale para o próprio PT. As alas moderada, dura e guerreira com sabor de guerrilha, vão aprender a conviver em harmonia. E já foram avisadas que pau que dá em Chico, dá em Francisco.

Lula está consciente de que não pode pacificar o país sem antes levar paz à própria equipe. Mais malicioso e bem mais experiente desde a primeira vez em que chegou ao Planalto, ele usará a esperteza para dar tiros certeiros. Para isso manterá suas conversas de bastidores. E Lula é rei nisso.

Os últimos desdobramentos políticos sugerem que o presidente vai ampliar o acolhimento dos mais necessitados. A esses manifestará mais proteção, como ficou registrado na visita aos desnutridos Yanamomi. Lula tem mostrado, nessas três semanas desde a posse, que o caminho é o da estabilidade e segurança.

Quem conhece Lula, conhece seu lado emotivo. Nostálgico, ele por vezes chora. Nessas ocasiões, lava o rosto e em especial os olhos, para ver o que se passa à sua volta. Faz-se de cego para aqueles que, tendo apenas um olho, se passam por reis. Mas nem por isso deixa de ter o cetro numa mão, e a caneta na outra.

Saudosismo é outra característica do presidente, que permeia sua mente em raros mas longos momentos. Nessas ocasiões lhe vêm à tona passagens do primeiro mandato que marcaram sua vida como cicatrizes insensíveis a cirurgias plásticas. Lula, agora maduro, não se permitirá flutuações de humor. Ele sabe que a agonizante sensação de abandono e desamparo ficaram para trás e não podem mais reverberar. Mas nem por isso deixará de estar alerta. Atento ao clima do seu entorno, não baixará as armas. Ele está consciente de que há uma nova trajetória pela frente.

Haverá uma ou outra pedra no caminho, é verdade, mas uma barreira intransponível evitará que aventureiros ultrapassem o Rubicão. Até porque, o presidente sabe ser direito constitucional de qualquer brasileiro pensar diferente dele. Mas querer sua cadeira, só em 2026. Isso se Lula, cada vez mais revigorado, não entender que precisará de mais quatros anos para aplicar a última mão de argamassa e anunciar que a casa chamada Brasil, tem, enfim, as chaves da porta que leva ao 1º Mundo.

Foram mais de duas horas de conversa, numa mesa longe da marquise, porque fumar é um hábito meu e desse amigo. Também falamos sobre o período da pré-melhor idade, é verdade, mas há coisas do coração que merecem ser relevadas, nunca reveladas. O importante é o que está escrito acima deste parágrafo. E lembrar que os salgadinhos servidos, não tinham pimenta. O vermelho é do morango.

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