Lula, que ‘não sabia de nada’, faz o povo rir do que ele anda dizendo sobre a corrupção
Publicado
emMarta Nobre, com José Seabra
Depois da marchinha o Japonês da Federal, o brasileiro começa a tirar do fundo do baú dois velhos sucessos musicais dos tempos em que o País era um pouco mais sério. Não a letra como um todo, mas apenas os refrões – ou os títulos, que sejam. Tudo numa associação direta ao o que o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva afirmou em depoimento à Polícia Federal.
Da dupla Leno e Lilian, volta às paradas de sucesso Eu não Sabia que Você Existia. De Edith Veiga ressurge, em tom de piada, Faz-me Rir. No primeiro caso, é essa a paródia, Lula, respeitado o que ele disse a Polícia Federal, na condição de informante, dá ‘graças a Deus’ após olhar (e orar aos céus) por não saber da existência, no seu governo, de dirigentes da Petrobras hoje presos na Operação Lava Jato.
Pela boca de Edith Veiga, a maior estrela petista provoca gargalhadas. ‘Faz-me rir o que andas dizendo’ diz o povo que a Lula adorava e que por ele até morreria. É esse mesmo povo, porém, que demonstra toda a sua insatisfação com o envolvimento do PT (e de Lula, lógico) com o Mensalão, com o Petrolão e outras ações de corrupção que abalam o Brasil. Ao ex-presidente, cabntando nas ruas, em rodas de mesas, o brasileiro manda um recado. “Não enganas dizendo mentiras; não enganas, não nos faças rir”.
Toda essa onda de saudosismo musical surgiu a propósito do que Lula declarou à Polícia Federal na quarta-feira, 16, numa operação que tentou ludibriar a imprensa. Mas, como mentira tem pernas curtas, o depoimento veio à tona com viés de verdade.
Lula caiu na vala comum ao dizer aos federais que existe um “processo de criminalização” do PT. E sustentou em sua fala, sabe-se lá porque, não ter conhecimento sobre os eventos de corrupção na Petrobras e, questionado a que atribui a existência de pessoas de seu governo investigadas na Operação Lava Jato, apontou três motivos: o aprimoramento dos processos de fiscalização, a imprensa livre, e (mais uma vez enfatizando), a criminalização do PT.
Na avaliação de Lula, os principais partidos da base aliada do governo não obtiveram vantagens indevidas a partir dos contratos das diversas diretorias da Petrobras. Não bastasse isso, ele ainda assegurou os nomes de dirigentes da Petrobras eram fruto de entendimentos políticos, de cujo processo ele que não participava.
Esses acordos políticos, admitiu Lula em seu depoimento, agora juntado aos autos que se encontram no Supremo Tribunal Federal, eram normalmente feitos pelo ministro da área, em conjunto com o coordenador político do governo e o partido interessado na nomeação. Não se sabe se ele contou, por exemplo, que Dilma Rousseff era a ministra da área (Minas e Energia) em boa parte do tempo em que ele esteve à frente do Palácio do Planalto. Ou que José Dirceu, uma espécie de ‘pai’ do Mensalão, era o seu chefe da Casa Civil.
Dirceu, todos sabem, está preso em Curitiba, por ordem expressa do juiz Sérgio Moro. Quanto a Dilma (a ministra ‘da área’) enfrenta um imbróglio político que pode deflagrar definitivamente um processo de impeachment.
Vantagem de dedo-duro – O ex-presidente da República sugere no depoimento que algumas informações prestadas pelos delatores sobre envolvimento do PT e de ex-diretores da Petrobras no esquema de corrupção foram feitas para obter os benefícios do acordo de colaboração com a Justiça.
“Indagado a que atribui a condenação, em primeira instância, de João Vaccari Neto, o Declarante (Lula) afirma que a mesma se deve às delações premiadas; que a condenação de Vaccari não é definitiva e que acredita que o mesmo será absolvido; (…) que acredita que as acusações feitas contra João Vaccari Neto são, na verdade, resultados dos benefícios referentes às delações dos diversos colaboradores da Operação Lava Jato”, consta no relatório do depoimento de Lula.
Ele disse que soube, pela diretoria do PT, que Vaccari fez um “excelente trabalho” à frente da tesouraria do PT. Vaccari já foi condenado pela Justiça Federal no Paraná.
O ex-presidente também atribuiu a José Dirceu responsabilidade pela indicação de diretores da Petrobras. Dirceu chefiou a Casa Civil durante parte do primeiro mandato do petista, entre 2003 e 2005, quando estourou o escândalo do Mensalão. Ele está preso desde 3 de agosto como alvo da Operação Lava Jato, que desmontou esquema de propinas na estatal petrolífera.
Investigadores já suspeitavam que Dirceu havia indicado o engenheiro Renato Duque – preso da Lava Jato desde março – para a Diretoria de Serviços da estatal petrolífera. Mas Dirceu sempre negou “que o nome de Renato Duque foi levado à Casa Civil da Presidência da República, à época chefiada por José Dirceu”, disse Lula.
Quem, quem? – Lula pode até não ter feito rir quem colhia o depoimento. Ao menos não na presença dele, ao sublinhar desconhecer “se foi o PT ou outro partido político que indicou Renato Duque para assumir a Diretoria de Serviços’. Afirmou que ‘não conhecia Renato Duque e que não participou do processo de escolha do nome de Renato Duque’.
Sobre o ex-diretor da Área Internacional da Petrobras, Nestor Cerveró, que também foi preso na Lava Jato e já está condenado a 17 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, o ex-presidente disse. “Que acha que Nestor Cerveró foi uma indicação política do PMDB; que Nestor Cerveró era um funcionário de carreira da Petrobras.”
“Que o declarante recebia os nomes dos diretores a partir de acordos políticos firmados; que este processo de acordos políticos era feito normalmente pela ministro da área, pelo coordenador político do Governo e pelo partido interessado na nomeação; que teve vários coordenadores políticos ao longo de seus oito anos de mandato; Que pode citar Tarso Genro, Jaques Wagner, Alexandre Padilha, Aldo Rebelo, etc; que não se recorda qual destes articuladores políticos tratou das nomeações de Renato Duque e também de Nestor Cerveró.”
Sobre outro ex-diretor que a Lava Jato pegou – Paulo Roberto Costa (Abastecimento) -, o ex-presidente disse que ‘seu nome foi apresentado pelo Partido Progressista’. “Como nos demais, o nome de Paulo Roberto Costa foi levado à Casa Civil para deliberação e posterior e posterior nomeação pelo declarante; que os nomes dos indicados pelos partidos não eram levados diretamente ao declarante; que, como explicado, o processo de escolha passava pela discussão com os diversos envolvidos no aspecto político e não somente com o ministro-chefe da Casa Civil; que, ao final deste processo, o declarante concordava ou não com o nome apresentado, a partir dos critérios técnicos que credenciavam o indicado.”
A PF quis saber de Lula se ele conversou com o ex-deputado José Janene (PP/PR, morto em 2010) sobre a indicação de Paulo Roberto Costa para assumir a Diretoria de Abastecimento da Petrobrás – Janene é apontado como o mentor do esquema de corrupção que se instalou na Petrobrás. O ex-presidente disse que ‘nunca conversou’ com Janene ‘a respeito de qualquer assunto’.
Quem ri melhor… – Lula também afirmou que nunca tratou com os deputados Pedro Henry e Pedro Corrêa sobre a indicação de Paulo Roberto Costa. “Nunca tratou com qualquer liderança de qualquer partido sobre a indicação de algum nome para cargo da administração pública; que os nomes eram apresentados pelo Governo, ou seja, pelos articuladores políticos que levavam O nome à Casa Civil da Presidência.”
Lula disse que ‘nunca se sentiu pressionado pela Partido Progressista a fim de que Paulo Roberto Costa fosse nomeado diretor de Abastecimento da Petrobrás’. Ele declarou que o PMDB ‘nunca ofereceu apoio político ao Governo a fim de manter Paulo Roberto Costa no cargo de diretor de Abastecimento, e se ofereceu tai apoio isto no chegou ao conhecimento do declarante’
A PF indagou de Lula sobre quais diretores da Petrobrás foram indicados pela PT. “O declarante afirma que talvez Renato Duque tenha sido uma indicação do PT.”
Lula sorriu intimamente quando conseguiu ludibriar (isso foi dito acima) a imprensa e apresentou-se na qualidade de informante à Polícia Federal em uma área pertencente à Procuradoria Militar. Tudo bem. Poer ser ex-presidente da Re´publica, ele tem lá suas regalias. Mas, como quem ri melhor é quem ri por último…
*Informações complementares de Beatriz Bulla, Andreza Matais, Gustavo Aguiar e Julia Affonso