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Maioria dos bolsonaristas perde encanto e já começa a virar lã

Após longos anos na cobertura política do Brasil a partir de Brasília, aprendi a conviver diariamente – às vezes à noite – com pessoas e grupos despreparados, dissimulados, sonsos, fingidos, manhosos, arrogantes, pedantes, maliciosos, enganadores, astutos, hipócritas, mentirosos, falsos, camuflados e populistas. Alguns – realmente alguns – sérios demais, consequentemente fora da curva traçada pelos demais. Todos – ou a maioria – políticos na essência. Alguns mais, outros menos, mas cada um com uma história (boa ou ruim) para contar. Mesmo utilizando do princípio da isenção para trabalhar, vez por outra me surpreendia com a eloquência, sagacidade ou inteligência de deputados, senadores, ministros de Estado, magistrados ou presidentes da República.

Às vezes, não raro ficava surpreso ao perceber os três substantivos na mesma pessoa. Foi assim com João Batista Figueiredo, Tancredo Neves, José Sarney, Fernando Henrique Cardoso, Itamar Franco, Luiz Inácio, Jarbas Passarinho, Antônio Carlos Magalhães, Nelson Jobim, Roberto Cardoso Alves, Ricardo Fiúza e Bernardo Cabral, entre outros menos importantes, embora também respeitados. Ainda que não houvesse afinidade ideológica, era prazeroso e fácil escrever uma matéria jornalística sobre um discurso ou debate envolvendo os citados. Tinha lead, conteúdo e, sobretudo, propostas concretas a respeito do projeto em discussão. Não me cabe julgar desvios de conduta de um ou de outro.

Se as punições ficaram aquém do desejo dos justiceiros, o toma lá, dá cá, os mensalões e as roubalheiras de ocasião não ficaram impunes. Estava no Congresso por ocasião da ascensão do então recém-encostado tenente Jair Bolsonaro. Condenado pelo Exército e absolvido pelo Superior Tribunal Militar por 9 votos a 4, foi para a reserva como capitão e daí elegeu-se deputado federal, instalando-se em um acanhado gabinete do Anexo 2 da Câmara, no fim do corredor das comissões. O ano era 1991. Por absoluta falta de confiança nas informações, nunca foi fonte de qualquer colega que cobria a Câmara ou o Senado. Não tinha assessoria e, quando queria “vender” algum “fato”, grosseiramente sorrindo procurava um de nós no Comitê de Imprensa da Casa em busca de algum espaço, principalmente nos jornais do Rio de Janeiro.

Sempre tinha a atenção de todos, mas raramente conseguia o que desejava. Quando tinha algo para dizer, as palavras soavam falsas. Faltava verdade, sobrava sarcasmo. Seu forte já era o ataque a colegas, opositores e às instituições. Consolidado como parlamentar, manteve a marca que por pouco, muito pouco, não o alijou do convívio com os pares. Não acredito que tenha feito amigos entre os congressistas. Talvez parceiros de oportunidade ou companheiros de ocasião. Exatamente como agora na Presidência. Apesar dessa trajetória esquisita, tinha votos. Tanto que chegou ao Palácio do Planalto com 57.797.847 dos sufrágios válidos. É bem verdade que boa parte deles herdada de eleitores aborrecidos com gestões anteriores.

Sinceramente, não sei se ele (Bolsonaro) dispõe mais de metade desses votos. Quanto aos aborrecidos, tenho certeza de que hoje a maioria se assume como desencantada com o bolsonarismo. Na pior da hipóteses, estão aperreados, apoquentados ou aporrinhados por conta da frustrada aposta. Tudo isso faz parte do jogo político. Por falar em jogo, só para lembrar, faz muito anos os amigos vascaínos escolheram Eurico Miranda como salvador da pátria cruzmaltina. Ele enriqueceu, mas, com a mesma rapidez, acabou com o Vasco da Gama, empobreceu o futebol do Rio de Janeiro e criou uma escola maldita que apequenou o esporte em todo o Brasil. Toda similaridade com o presidente da República é bobagem.

Inegável que o governo Bolsonaro patina em todos os quesitos: tem péssimos índices de aprovação, conduz uma economia cada vez mais cambaleante, não tem respostas para nada e enfrenta uma série de investigações judiciais. Lamentável registrar, mas foi infeliz até nas mais simplórias promessas. Considerada absurda desde a divulgação, uma delas tinha a ver com a extinção da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), considerada à época como aparelho do PT. Só perceberam agora que a empresa é a holding de uma das maiores e mais competentes agências de notícias estatais do mundo. Hoje, tanto o brinquedinho TV quanto a Agência Brasil são usados exatamente como veículos de proselitismo político e promoção pessoal da galera do cercadinho. Longe da missão constitucional de informar à população, a EBC transformou-se em difusora de fake news.

Tudo baseado no script do criador que faz algum tempo saiu de cena. Se escondeu em Las Vegas, onde faz bicos de comentarista de boxe. A criatura, no entanto, continua vagando de moto pelas ruas do Brasil, acompanhado de um grupo que ainda vê na soberba a melhor forma de viver. É exatamente esse povo que hoje comanda boa parte do Brasil e se acha mais poderoso do que realmente é. Deixam pegadas por onde passam, espalhando uma tese muito utilizada por George W. Bush na presidência dos Estados Unidos: “Não me considere o chefe. Considere-me apenas um colega de trabalho que tem sempre razão”. É o que acontece por aqui. O presidente raramente acerta, mas jamais está estará errado. Pelo menos é assim que o vê parte da população que ainda o idolatra. A verdade é que hoje lhe faltam eleitores, mas sobram fãs. E fãs são passageiros. Servem somente para mostrar ao ídolo o quão transitório é o poder. Amanhã, o idolatrado será outro.

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