Alerta com sonoridade
Manifesto é início da reação do brasileiro ao golpismo do mito
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emDefinitivamente, o povo brasileiro quer ser livre. Os 152 milhões de eleitores querem eleições livres e, sobretudo, obediência ao resultado de 2 de outubro. Que o vencedor seja qualquer um, inclusive Jair Bolsonaro, mas que seja pelo voto soberano, secreto e seguro. Chega de golpismo, de estultices para aplausos de seguidores fanatizados. Por mais que os bolsonaristas tenham debochado – e debocharam – das manifestações dessa quinta-feira (11) em defesa do Estado Democrático de Direito, o ponto alto, muito alto mesmo, da leitura de numerosos manifestos contra a tirania foi alertar o presidente da República e seu entorno que democracia e respeito às liberdades e ao sistema eleitoral do país são bens inegociáveis.
Mais do que isso. São questões capazes de unir com rapidez setores de A a Z. Por exemplo, duas das principais cartas foram redigidas, em momentos distintos, a partir da intensificação dos ataques de Bolsonaro e apoiadores às urnas eletrônicas, notadamente após a desnecessária reunião em que o presidente elencou um rosário de mentiras eleitorais para embaixadores estrangeiros. A maioria dos documentos foi elaborada em momentos distintos. Um deles tem a marca de juristas ligados à Faculdade de Direito da USP. O outro tem o peso da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e de mais de cem entidades vinculadas às elites paulista e brasileira.
Simbólicos e tão importantes como as Diretas Já, entre março de 1983 e abril de 1984, os manifestos e as cartas reuniram acadêmicos, empresários, políticos, líderes sindicais, artistas e estudantes de variadas correntes partidárias. Embora representando siglas diferentes, o objetivo imaginado pelos participantes de todos os atos foi atingido. Silenciosamente ou com os decibéis necessários para alcançar o mundo, as milhares de vozes tiveram a mesma sonoridade: um estrondoso não às teses golpistas de Jair Messias Bolsonaro. Não foi apenas um alerta, mas um duro recado àqueles que insistem em ameaçar a democracia. Implicitamente, ficou claro que haverá reação a qualquer tipo de ação fora das quatro linhas.
Como não poderia deixar de ser, o chefe de governo e seus fiéis e moribundos aliados, entre eles o ministro da Casa Civil, o ex-lulista de carteirinha Ciro Nogueira (PP), subiram no salto debochadamente. Se não fizessem pouco caso das manifestações pró-democracia, juraria que a ordem havia sido modificada e que os rabos do Planalto estavam correndo cegamente atrás dos cachorros. Para eles, mais importante do que as cartas foram a deflação (?), a queda dos preços do diesel e o crescimento do mito nas intenções de voto em São Paulo. Sinal de que vestiram a carapuça.
Se isso não é representativo para o Palácio do Planalto e para Ciro Nogueira, um dos caciques do Centrão, aguardemos a abertura das urnas. Por enquanto, o que Bolsonaro e sua turma mais temem é a aliança entre a magia de um dos adversários e a letalidade do povo. Adianto que, caso o “democrata” Jair Bolsonaro vença no voto, teremos o Brasil que merecemos. Em outras palavras, chutamos o balde e recebemos água na cara como troco. Faz parte do jogo democrático. Inaceitável é votarmos sob o domínio do medo. Sobre os manifestos, sorte de uma nação quando a sociedade percebe que o silêncio consciente e conscencioso é a pior das omissões. As cartas são a prova de que começamos a reagir, sem perder a ternura.
*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978