Notibras

Maria Tereza, queixosa, aprende mais uma sobre saidinha com namorado

A velha, assim que abriu a porta, notou que a neta, no viço dos 19 anos, estava acabrunhada no sofá. Olhos marejados, a garota tentou disfarçar passando o dorso das mãos no rosto.

Para tornar o teatro mais convincente, simulou um espirro, que soou tão falso, que até ela riu.

— Ah, vó, essa poeira tá atacando de novo a minha alergia.

— Que poeira, Maria Tereza?

— Acho que vou passar um pano na casa.

A avó encarou a parenta e sorriu.

— Namorado?

— O quê?

— Tá assim por causa do namorado?

— Não, vó!

— Tá bom, mas não precisa gritar. Sou velha, mas ainda não sou surda.

— Desculpa, vó.

— Vem cá e me dá um abraço.

Maria Tereza, enlaçada, recostou o rosto entre os seios da matriarca. Não tardou, desandou a chorar.

— Vó, isso não é justo!

— Do que você tá falando, minha filha?

— Mamãe.

— O que tem a sua mãe?

— Ela não entende as minhas vontades.

— Todas temos as nossas vontades, Maria Tereza.

— É que a minha mãe fala que não sou uma boa cristã, pois não cumpro com os ensinamentos da Bíblia. Que não posso viajar sozinha com o Francisco, pois não somos casados.

— Posso te falar uma coisa?

— Pode.

— Não se sinta culpada. Religião é um imenso self-service.

— Como assim, vó?

— É que você se serve com o que te apetece e ignora o resto.

A menina olhou para o rosto enrugado da avó e as duas se abraçaram por mais um tempo.

— Ah, vó, muito obrigada! Só a senhora mesma pra me fazer sorrir.

— Vó é pra isso, Maria Tereza.

A jovem agradeceu novamente e, quando já ia se despedir, voltou os olhos para a idosa, que lhe disse:

— Só mais uma coisinha, minha filha.

— O que, vó?

— Lembre-se de se proteger.

*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.

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