Galão de Jaboatão
Matheus, na falta de sereia, fisga uma pereroba para tentar ludibriar Larissa

Uma passagem rápida por Jaboatão dos Guararapes, na grande região administrativa que circunda o Recife. O nome é comprido, mas o tempo de paz no trânsito é curtíssimo. Ali, entre coqueiros tortos pelo vento e uma maresia que parece manteiga no pão quente, ficam as praias de Piedade e Candeias. Cartões-postais naturais, onde a beleza é tão democrática que distribui bronze até pra quem passou protetor solar só no nariz.
É nesse cenário digno de novela das oito que vive Matheus, empresário do ramo automotivo — não no sentido de montadora, mas no de manter uma frota de carros de aplicativo que parece um formigueiro motorizado rodando pela Grande Recife. Matheus, porém, não é lembrado apenas pelo ronco dos motores. Ele é o “Galã do Pedaço”, autointitulado herdeiro da elegância de Marcello Mastroianni, com a libido de um cabra que confunde Uber com cupido.
De bermuda e um Prada que já viu mais selfies que retrovisor, Matheus desfila pela orla com o olhar caçador de quem jura que ainda está no elenco de La Dolce Vita. O problema — e sempre tem um problema — atende pelo nome de Larissa.
Larissa, sua esposa, é do tipo que não grita, mas silencia. E um silêncio dela pesa mais que um sermão de sogra em grupo de WhatsApp. Conhecida como “a freio de mão mais eficiente de Jaboatão”, ela conduz o galã como quem segura uma carroça em ladeira molhada; firme e com freada brusca.
Matheus até tenta dar suas escapadas poéticas. Vai à praia com desculpas tão criativas quanto calibrar os pneus com vento de maré, ou o carro só pega quando escuta barulho de onda. Lá, entre bronzeadores e biquínis que parecem fiapos de algodão doce, ele lança seu olhar de arpão em direção às “sereias” da areia.
Mas o que ele pesca, mesmo, é uma pereroba. Literalmente. Um peixinho espinhoso e sem glamour, que nem no Instagram fica bonito. Ainda assim, Matheus sorri. Levanta o anzol, mostra o bicho como quem ergue um troféu do Campeonato Mundial de Tentativas Frustradas. Afinal, como diz o ditado reinventado por ele: “Quem não tem cão, caça com gato… ou com um Fiat Uno 2010 com ar-condicionado que só funciona em dias santos.”
E lá vai ele, voltando para casa com um peixe que ninguém quer comer, mas que pelo menos rende história. E no fundo, é isso que mantém o galã em paz – saber que entre um suspiro reprimido e uma rédea apertada, há sempre o calor dos braços da esposa.
Não acredite o caro leitor, porém, que a história acabou. Não satisfeito com a fauna de Piedade, Matheus às vezes se aventura mais longe. Vai até Itapuama, sob o pretexto de visitar os pais, Júnior e Rose, ou um “ponto estratégico de verificação de tráfego”. Uma desculpa, convenhamos, que só engana quem não sabe que tráfego ali é de corpos bronzeados em slow motion.
Lá, entre a água morna e bares que vendem cerveja mais gelada que sogra em velório, Matheus segue em sua busca – encontrar uma sereia dando sopa. Às vezes aparece uma, mas sempre tem um namorado musculoso por perto, geralmente chamado “Cleitão”, com tatuagem de dragão e vocabulário de MMA.
E quando o caldo engrossa, Matheus dá o fora com a habilidade de quem já decorou o caminho da fuga. Nessas ocasiões, ele entra no carro, disfarça com um “opa, me confundi, pensei que fosse minha prima” e acelera até sentir o conforto emocional da BR-101.
Mesmo assim, o Galã do Pedaço não desiste. Continua firme em sua cruzada romântica e meio atrapalhada, colecionando histórias, escoriações leves e bloqueios no Instagram. Porque no fundo, Matheus não quer só flertar. “O que desejo”, costuma dizer aos amigos, “é viver”. E isso nem que seja só por trinta minutos, antes do GPS entregar sua localização à Larissa.
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José Seabra é Diretor da Sucursal Regional Nordeste de Notibras
