Teve vida curta o ofício que o Ministério da Educação encaminhou às universidades federais considerando manifestações políticas como “imoralidade administrativa”. O novo posicionamento foi encaminhado às instituições após o Ministério Público Federal (MPF) cobrar explicações da pasta sobre o caso.
O novo ofício assinado pelo secretário de Educação Superior Wagner Vilas Boas de Souza afirma que o documento enviado às instituições federais em fevereiro visou “unicamente prestar informações às universidades sobre a possibilidade e conveniência de regulamentação (no exercício da autonomia universitária) acerca da cessão e utilização de seus espaços”.
“Não há, no ofício-circular em questão, quaisquer intenção de coibir a liberdade de manifestação e de expressão, no âmbito das instituições federais de ensino superior”, afirmou. “Foi buscado tão somente, orientar as universidades a garantir o bom uso do recurso público, sem, contudo, se dissociar do resguardo de todas as formas de manifestação livre de pensar nos ambientes universitários”.
Segundo Souza, a Corregedoria do MEC apontou a ausência de regulamentação sobre utilização indevida de dependências das universidades em processos correcionais. “A Corregedoria sugeriu e recomendou que se avaliasse a conveniência e oportunidade de cada instituição regulamentar a adequada utilização dos bens públicos”, apontou.
O cancelamento do ofício ocorre após o Ministério Público Federal cobrar explicações do MEC sobre o caso. Um dos documentos exigidos pela Procuradoria foi a cópia da solicitação feita pela Corregedoria que levou ao envio de uma manifestação assinada pelo procurador bolsonarista Ailton Benedito. O documento classifica manifestações políticas como atos de “imoralidade administrativa”.
A manifestação foi enviada às universidades pela Rede de Instituições Federais de Educação Superior. O órgão ressaltou que as recomendações feitas por Benedito visavam a “tomada de providências para prevenir e punir atos político-partidários nas instituições públicas federais de ensino”.
“A utilização de dependências físicas, o uso de bens móveis, materiais ou imateriais, para a promoção de eventos, protestos, manifestações, etc de natureza político-partidária, contrários e favoráveis ao governo, caracteriza imoralidade administrativa”, apontou o ofício do MEC, citando a manifestação assinada por Ailton Benedito.
Em despacho enviado ao MEC na quarta-feira, 3, o procurador Enrico Rodrigues de Freitas, responsável pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão no Rio Grande do Sul, cobrou uma cópia da solicitação da Corregedoria que motivou o envio do ofício às universidades e também todo o procedimento administrativo que levou à expedição do documento. A pasta tem dez dias para apresentar as informações.
Em outra frente, um grupo formado por 25 subprocuradores assinaram um memorando nesta quinta-feira, 4, pedindo uma manifestação da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre o ofício. No documento, o grupo destaca que a posição defendida por Ailton Benedito no documento repassado pela pasta às instituições é isolado e embasado na independência funcional e em sua “mundividência”.
O memorando foi enviado ao procurador federal dos Direitos do Cidadão Carlos Alberto Vilhena. Segundo os subprocuradores, é preciso uma reação da Procuradoria em defesa da liberdade de expressão das universidades, firmada pela decisão do Supremo Tribunal Federal.
“Sem embargo do postulado da independência funcional da qual se valeu o procurador da República subscritor da recomendação para, exprimindo sua mundividência, adotar aquela medida, cabe sublinhar, aqui, que constitui função institucional da instituição do Ministério Público como um todo a defesa do regime democrático, a qual se baseia, entre tantos pilares, na garantia fundamental da liberdade de expressão. Esta constitui postulado essencial ao funcionamento do Estado de Direito, sendo o traço qualificador de toda e qualquer sociedade substantivamente livre e democrática”, anotaram os subprocuradores.