Imprecisão anormal
Medo do mito é ter medo de perder o que nunca teve
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emVia de regra, as piadas ou as histórias não são contadas para degradar o ser humano, mas para lembrar que naturalmente ele é um ser degradado. Longe de mim imaginar que um presidente eleito por maioria de votos possa virar piada. Seria jogar contra a liturgia do cargo. Não fosse a necessidade, também reconheceria não ser de bom alvitre cobrar exaustivamente por respeito ao povo. Entretanto, tenho o dever de fazer coro àqueles que reagem à forma como o Brasil é vilipendiado, jogado na lama e detonado pelo próprio mandatário. Tudo já foi dito sobre o assunto, mas, para encerrá-lo, não custa lembrar que o troco dos ataques virá em breve. Pelo menos é o que esperam cerca de dois terços do eleitorado nacional.
Talvez isso ocorra antes mesmo da divulgação da primeira pesquisa de boca de urna. Caso não haja a merecida resposta, serei obrigado a admitir que nascemos para sofrer. Seremos merecedores de todas as mazelas que certamente virão. Muito pior do que a falta de tato para o cargo, é a ambiguidade do perfil do chefe de governo. Seu estilo absolutamente desprovido de clareza de opiniões gera dúvidas mesmo quando há alguma assertividade em suas falas. Eleito para governar para todos, inclusive para os que não concordam com suas teses estapafúrdias, a ambivalência, imprecisão ou equívoco de seus posicionamentos é algo bem próximo da anormalidade.
Para não ser deselegante com sua excelência, diria que a confusão de seus pensamentos é surreal. Seguindo à risca o conceito de ambíguo, podemos dizer que o presidente da República não nos mostra sua verdadeira face, que é oculta até para ele mesmo. Obviamente que pessoas inexatas são evasivas por conveniência. Ainda que saibam que têm pernas curtas, jogam para a plateia com medo de perder o que nunca tiveram: o comando. Fazem acordo com Deus e com o Diabo como se estivessem vivendo o último dia de suas vidas.
Para essas pessoas, enlamear o prato em que comem é apenas mais um detalhe sórdido da existência. Entretanto, tudo tem volta. Tudo que é feito deixa rastro. Pode ser belo ou feio, limpo ou sujo, perfumado ou malcheiroso, mas a trilha há de ter um ponto final. O problema é que ação dura instantes. Todavia, a consequência pode durar eternidades. Jair Messias oficializou sua candidatura nesse domingo (24). Seus concorrentes fizeram o mesmo ao longo da semana passada. No entanto, nenhum deles precisou buscar alternativas para esconder a pior das ambiguidades: o medo de sentir medo.
É esse o sentimento dominante no cercadinho do líder, cuja aposta é não perder a sobra do ódio que destilam para esconder o que jamais experimentaram: a razão. Candidatíssimo desde a posse, em 1º. de janeiro de 2019, o mito resolveu recuperar o discurso golpista e os ataques aos ministros do STF. A ação desarrazoada soou como uma desesperada tentativa de atentar contra a liberdade do povo para se garantir no poder. Porém, duas coisas passaram longe da cabecinha de madeira do moço. A primeira é que aqueles que negam liberdade aos outros não a merecem para si mesmos. Mais forte do que a bala e ainda mais letal para quem se nega a aceitar a verdade, a segunda é a principal arma do povo: o voto.
Convicto de que o peso da decepção é muito mais relevante do que o tamanho da mentira, continuarei botando fé no Deus brasileiro. Somente Ele e os eleitores do bem poderão nos livrar definitivamente desse martírio denominado desgoverno. Quanto ao enxovalhamento do STF, vale lembrar que, embora com posicionamentos e decisões pra lá de ambíguos, os homens da capa preta são pacientes e sabem quando agir. Só para ilustrar, apesar de recuos históricos do STF, dois dos três últimos presidentes brasileiros aprenderam que perder não é apenas o contrário de ganhar, mas o significado de aprender à força. Eis a razão do medo do rebanho e do condutor do gado. Eis a razão da necessidade de um novo atentado à democracia.
*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978