Carisma incômodo
Melancólicos e conservadores sempre invejaram papa popular

Hostis a todos e quaisquer vencedores, raivosos, venenosos e rancorosos, os representantes mais arcaicos do conservadorismo brasileiro demoraram, mas também se assumiram como pessoas medíocres, melancólicos e invejosos. Eles não admitem publicamente, mas nos bastidores ou em suas reuniões condominiais reagem com o ódio de sempre ao sucesso, à vitória e à popularidade de qualquer ser humano que não faça parte do grupelho a que eles pertencem. É triste reconhecer e atestar a existência de brasileiros tão mesquinhos, enciumados e com dores de cotovelo que não cabem em seu apodrecido corpo.
Depois de Lula da Silva e da multidão que expurgou Jair Messias e sua legião do mal, a bola da vez é o papa Francisco, aquele que acolheu em vez de julgar e que, não à toa, preferiu não ter uma foto com Bolsonaro. Chefe mais carismático que a Igreja Católica já teve e um dos poucos a pensar prioritariamente nos pobres, o popularíssimo Francisco incomodou de tal forma o bolsonarismo que, por pura e máxima inveja, os bolsonaristas o criticam desde a derrota do ex-presidente alcunhado de mito, em outubro de 2022. Mentira que eles não sabem o que dizem.
Tanto que, mais do que desejar e torcer pela morte do santo padre, a maioria comemorou a passagem de Francisco nas redes sociais, nas quais publicou textos impiedosos, idiotas e maledicentes. Apáticos, inexpressivos, macambúzios e sorumbáticos, os mais radicais, entre eles Javier Milei, chegaram a afirmar que Jorge Mario Bergoglio comandou o “pontificado da subversão e da aliança com canalhas” e que sua morte encerra um ciclo vergonhoso na história da Igreja Católica. Vergonha maior é a patriotada não se render à força dos vitoriosos.
Sem querer ideologizar a narrativa, lembro que Francisco se rendeu a Lula em duas ocasiões. Por isso, merece o ódio eterno dos puxa-saco de um mito à beira da morte política. Na contramão da comoção mundial, a dúzia e meia de estultos que acham o falecido papa argentino “de esquerda, do globalismo e da traição silenciosa aos ensinamentos de Cristo” realmente sabe o que diz. Sabem e não perdoam o fato de, em vida, Bergoglio se associar à agenda progressista de Lula e de tantos outros líderes que, com algumas exceções, verdadeiramente defendiam a liberdade.
Aos ditadores ele sempre dedicou a frieza e o pouco caso. Na verdade, pouquíssimo caso. Aos democratas, o sorriso largo e sincero. Para os radicais da direita, o gesto de desprezo papal aos trogloditas da tirania é imperdoável. Por razões óbvias, os senhores do ódio avaliam que, em nome da inclusão, Francisco “tolerou o avanço da heresia”, em nome do diálogo, “se calou diante da blasfêmia” e, em nome da modernidade, “esvaziou os templos”.
Hereges são aqueles que insistem na blasfêmia de que, com “teologia diluída, populista e ambígua”, Jorge Bergoglio “confundiu os fiéis, desmotivou vocações e afastou milhares da Igreja”. Pode ser, mas o catolicismo continua sendo a religião primária e definitiva de quase 1,5 bilhão de pessoas em todo o planeta. Isso os fariseus também não perdoam. Aliás, pior do que a ausência de Jair Messias no funeral de Francisco é a presença de líderes com os quais o bolsonarismo lambe botas comunga, entre eles Donald Trump, Benjamin Netanyahu e a italiana Giorgia Meloni. Antes que eu me esqueça, Lula da Silva deverá tomar assento na primeira fila. Realmente a inveja é uma merda.
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Misael Igreja é analista de assuntos políticos, sociais e econômicos de Notibras
