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Minha vizinha da frente, qual o seu nome?

Hoje acordei com vontade de escrever, mas me faltam memórias para tal. Saudade de um tempo em que corria por este bairro de onde saí tão jovem. Tinha lá meus 18 quando, por sorte, passei no concurso do Banco do Brasil. Há tanto tempo, que todos os meus amigos me invejaram, tamanho que era o salário naquela época. O pessoal na rua comentava: “Você viu? Pois é, o Quinzinho, filho da dona Eulália, passou pro Banco do Brasil.”

Como consequência desse sortilégio, fui tomar posse em uma cidadezinha lá do interior de Minas Gerais, tão distante desta em que agora me encontro. Fui, mas com a promessa de retornar em poucos anos. Tal jura, no entanto, só foi cumprida há pouco mais de dois meses, quando aqui estou com meus quase 70.

Durante o longo período de bancário, trabalhei com afinco e, aos poucos, fui galgando cargos até que, quase 20 anos após, cheguei ao invejado posto de gerente geral da agência. Todos me conheciam como senhor Oliveira. Todos! Desde o mais graúdo investidor até os que sobreviviam com meros vinténs.

De tão afamado me tornei, o próprio presidente do Banco do Brasil veio me pedir para não me aposentar quando completei meu tempo de serviço. Comovido com tamanha honraria, fiquei por mais alguns anos. Na verdade, agora que estou em tal situação, não preciso mais viver sob a fumaça da hipocrisia. Fiquei por conta da sensação de poder, além, é óbvio, pelas inúmeras regalias, sem contar o salário muito maior do que eu poderia gastar.

Os anos seguintes foram talvez os mais incríveis da minha vida. E, se não foram, são os que ainda pululam minha mente. Jantares regados a iguarias, noites em quartos de hotéis cinco estrelas, sempre muito bem acompanhado por mulheres lindas, mesmo que recompensadas por notas graúdas, que não me fizeram falta.

Aos 66, conheci Sandra, que tinha lá seus 38. Linda, linda, linda! Não sei o que ela viu em mim, já que era de uma família mais abastada do que todo o dinheiro que eu poderia ganhar trabalhando no mais alto posto do Banco do Brasil por mais de um século. Seja como for, nos envolvemos e, de tão apaixonados, resolvemos comemorar nosso primeiro ano juntos.

Viajamos para Paris, onde ficamos hospedados no Ritz. Passeamos pela famosa cidade, fomos a museus e todos os passeios possíveis durante oito dias, até que Sandra pôs na cabeça que queria realizar um antigo sonho: sobrevoar Paris num balão. Apesar do flagrante pavor, decidi acompanhar a minha amada.

Foi numa quarta-feira quando tudo aconteceu. Contratamos um baloeiro, que nos orientou sobre o voo. Tudo parecia maravilhoso, até para mim. Comecei a me soltar quando, de repente, aquela enorme bola cheia de gás começou a rodopiar pelo céu da capital francesa e, desesperados com as labaredas cada vez mais próximas, pulamos quando estávamos a pouco mais de 20, 30 metros do chão.

O baloeiro, que até hoje não sei o nome, e minha Sandra tiveram morte instantânea. Eu, por sorte ou azar, sobrevivi, apesar de múltiplas fraturas, incluindo três vértebras cervicais, que me deixaram paralisado do pescoço para baixo.

Depois de quase dois anos de fisioterapia, retornei para a antiga casa, herança da minha falecida mãe, dona Eulália. Passo o dia inteiro deitado numa cama cheia de controles, que consigo acionar com um canudo preso à minha boca. Meu maior divertimento, o único na verdade, é observar a minha linda vizinha, que costuma sair de casa e se sentar numa dessas cadeiras de praia na calçada.

Minha vizinha, de vez em quando, cumprimenta alguém que passa, com um sorriso, que me chega aos olhos como o mais lindo que conheci. Mas ela parece preferir se entreter com seu aparelho celular. Não sei se ela já me viu ou se sabe da minha existência. Todavia, ainda me resta uma última esperança, provavelmente a única que me faz querer viver: descobrir o seu nome.

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