Integrante do Partido Operário Comunista à época, Merlino foi preso em 15 de julho de 1971, em Santos, e levado para a sede do Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi). Lá, ele foi torturado por cerca de 24 horas e morto quatro dias depois. Para a família de Merlino, o coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra foi quem ordenou as sessões de tortura que o levaram à morte. Ustra foi comandante do DOI-Codi em São Paulo, um dos maiores centros de repressão durante a ditadura militar.
A família de Merlino moveu uma ação por danos morais contra Ustra. Na decisão de primeira instância, o coronel Ustra foi condenado a indenizar a família em R$ 100 mil por ter participado e comandado sessões de tortura que mataram o jornalista. A defesa de Ustra recorreu da ação.
A versão de Ustra sobre o caso, segundo o MPF, é que Merlino teria se atirado sob um carro durante tentativa de fuga. “Para tornar a história verossímil, Ustra mandou que um caminhão a serviço das forças de repressão passasse por cima do corpo de Merlino e deixasse marcas de pneus”, sustenta o MPF.
No Instituto Médico-Legal, o médico legista Orsini endossou a versão de Ustra ao assinar o laudo sobre a morte e omitiu as agressões sofridas pelo jornalista nas sessões de tortura. Na década de 1990, peritos revelaram inconsistência no laudo de Orsini.
Além da condenação dos denunciados, o Ministério Público quer também que eles percam seus cargos públicos ou suas aposentadorias e que suas penas sejam aumentadas por uma série de agravantes: motivo torpe para a morte, emprego de tortura, abuso de poder e prática de crime para ocultação e impunidade de outro.
O advogado Paulo Esteves, que defende Ustra, disse que vai esperar o pronunciamento da Justiça, mas já informou que caso a Justiça aceite a denúncia contra seu cliente fará a defesa com base na Lei da Anistia. Para os procuradores, no entanto, não se pode falar em prescrição ou anistia neste caso. “Os delitos foram cometidos em contexto de ataque sistemático e generalizado à população, em razão da ditadura militar, com pleno conhecimento do ataque, o que os qualifica como crimes contra a humanidade, portanto, imprescritíveis e impassíveis de anistia”, diz a denúncia.
Para Ângela Mendes de Almeida, que foi companheira de Merlino, a denúncia feita pelo MPF pode desencadear uma série de outras ações, por outras mortes de militantes, ocorridas durante o regime militar. “Acho esta uma ação muito importante, porque esses crimes não podem ficar impunes”, disse ela.
Elaine Patricia Cruz, ABr