Moacir, apesar de nunca ter sido arroz de festa, também jamais se esquivara de confraternizações. Comedido, é verdade, mas sempre polido e disposto a enfrentar mais algumas horas junto aos amigos, mesmo que fosse para escutar bobices dos cada vez mais alcoolizados.
Por conta desses festejos, o gajo conquistou a promoção que seria de outro, que, aos olhos do chefe, parecia possuir maior competência. E o patrão não estava enganado, pois o funcionário, a princípio escolhido, detinha qualificações dificilmente igualáveis em toda a região, quiçá no país. No entanto, Osório, o preferido, não tardou, entrou em desgraça. O motivo? Tinha ojeriza a comemorações.
— O homem é um animal social! – entonava o dono da empresa.
— Aristóteles, né chefe? – Moacir disse.
— Sim, meu jovem!
Não pense você que foi por saber o autor de tal pensamento que fez Moacir ser o nomeado para o tal posto. É que havia uma segunda opção, justamente o Dimas. Pobre sujeito, pegou gripe e não pôde ir para os festejos. Também havia um terceiro nome, que, por conta do alto nível alcóolico do patrão, foi esquecido, da mesma forma como aconteceu com o quarto e o quinto.
Já quase no final do evento, Moacir era um dos raros que permaneciam no salão. Sorte mesmo foi ele estar justamente ao lado do chefe na hora deste, finalmente, anunciar o novo gerente de vendas da empresa. Totalmente desorientado, o homem se levantou e deu de cara com o Moacir.
— Qual é mesmo o seu nome, meu rapaz?
— Moacir, seu Ludovico.
— Moacir! MO-A-CIR! Pois você, a partir de segunda-feira, é o novo gerente de vendas da Ludovico Comércio Ltda.
Na segunda-feira seguinte, nem mesmo o Ludovico se lembrava da bobagem que havia dito. Todavia, como disse diante da pequena plateia que ainda estava na festa da firma, não teve como voltar atrás. Entretanto, aquela impulsividade não foi tão ruim assim, pois Moacir se mostrou um ótimo gerente nos anos seguintes. Melhor ainda, já que o patrão e o Moacir se tornaram amigos, desses que confidenciam quase tudo que pode ser confidenciado a alguém além do que é dito para o próprio reflexo diante do espelho.
Quando já estava prestes a completar dez anos no cargo, eis que surgiu uma nova possibilidade de promoção. Moacir sabia que não era o que detinha os melhores atributos, mesmo porque o eleito precisava ter fluência em inglês, quando ele não ia muito além do “The book is on the table”. Carta fora do baralho, o homem declinou do convite para a festa daquele sábado, justamente a data em que Ludovico anunciaria o novo gerente de exportações.
— Chefe, desculpe, mas não vou ao evento de amanhã.
— Ué, por que não vai, Moacir?
— É que a minha bateria social acabou.
Ludovico, incrédulo, observou o empregado durante um minuto ou dois. Em seguida, fingiu que precisava fazer uma ligação, e Moacir saiu da sala, certo de que, além de não ter qualquer chance de ganhar uma promoção, corria sério risco de perder o cargo de gerente de vendas e, até pior, ser posto no olho da rua.
O final de semana foi repleto de angústia para Moacir, que não conseguia parar de pensar na bobagem que havia feito. Tentou pegar um cinema, mas caiu um temporal tão forte, que preferiu não arriscar. Ficou em casa e decidiu assistir a uma partida de futebol pela televisão. Acabou ficando ainda mais desanimado, pois seu time tomou aquela goleada.
Na segunda-feira, Moacir se arrumou para ir trabalhar. Não vestiu a melhor roupa nem a pior, mas a que serviria para qualquer ocasião. Mal chegou à empresa, Lúcia, uma colega, disse que o patrão queria lhe falar urgentemente. Moacir quase enfartou, até que se recompôs e se dirigiu à sala do chefe. Mal entrou, encontrou o dono da empresa ao telefone.
Alguns minutos se seguiram, que pareceram horas, até que Ludovico desligou o celular e soltou um palavrão. Moacir, temendo a maior desgraça, abaixou os olhos.
— MO-A-CIR!
— Sim.
— MO-A-CIR!
Silêncio.
— Meus parabéns, meu amigo! Você é o nosso novo gerente de exportações.
Moacir não podia acreditar no que estava ouvindo. Como assim? Gerente de exportações? Logo ele, que nem falava inglês? Pior, pois declinou de comparecer à festa. Mal sabia ele que o Ludovico tinha lá as suas razões. É que ele temia ter falado demais em suas confissões para o subalterno.
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*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.