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Moças de vida fácil são mais confiáveis do que políticos de fácil vida

Tenho consciência de que brigar por política no atual cenário é o mesmo que ter uma crise de ciúme na casa de saliência. Todavia, é impossível não reconhecer que a palhaçada de duas dúzias e meia de parlamentares comprometidos com o caos é ilimitada, grosseira, patética e sem graça alguma. A convicção é de que ela só acabará quando atearem fogo na lona do circo chamado Congresso Nacional e no anexo conhecido por Câmara dos Deputados. Ainda que simbólicas, as labaredas devem ser proporcionais ao tamanho do nariz de palhaço que suas excelências querem colar em nossas ventas. Fossem verdadeiras como o fogo do inferno, seria uma pena as chamas alcançarem supostos santos envenenados pela maldição imposta pelos que são conduzidos exclusivamente pelo interesse pessoal.

Sem força anímica para terem orgulho do que fazem, os deputados do tipo Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), um dos 33 autores do projeto que compara aborto pós-estupro a homicídio, não se permitem admitir que são eles os maiores estupradores do Brasil. Usando de eufemismos como fundos eleitorais e emendas parlamentares, metem a mão em dezenas de bilhões de reais que deveriam ser usados para educar crianças e adolescentes contra aproveitadores de mulheres frágeis e indefesas. Isso os homens públicos que misturam religião com política não divulgam e nem condenam. Se o fizerem, perdem o dízimo, bufunfa que ganham religiosamente de forma ainda mais tranquila.

Em nome de Jesus, os integrantes desse grupo se embrenham cada vez mais no que existe de pior no ser humano: pensam estar acima do bem e do mal. Se verdadeiramente eles acreditam em céu e inferno, o ideal é que se preparem para os caldeirões até a boca de enxofre. Sou brasileiro com muito orgulho e com muito amor. Por isso, não cometo o erro de pensar que tenho de concordar com as pessoas e suas crenças para defendê-las da injustiça. É o que fazem os carregadores de Bíblias ocas. Para esses, a salvação somente se adquire com dinheiro na mão. O problema é que os espertos pregam essa indecência religiosa e alguns tolos acreditam.

São pessoas desse naipe que defendem a política sem alternância, a que é feita para políticos que matam pelo poder, se elegem para usufruir e nunca contribuem. Não tenho o dom da verdade, mas, mesmo leigo, não é difícil afirmar que quem se envolve com político ruim é cúmplice do que é feito por meio dele. Diriam os sábios que, quando as escolhas políticas são religiosamente corruptas, os demônios assumem seus mandatos. Autodidata, Nicolau Maquiavel definiu bem os que ainda hoje acham que os preconceitos têm mais raízes do que os princípios: “Como é perigoso libertar um povo que prefere a idolatria e a escravidão”.

Segundo Maquiavel, “para bem conhecer o caráter do povo é preciso ser príncipe, e para bem conhecer o do príncipe é preciso entender o povo”. Que me perdoem os parvos, mas ver alguma correção na proposta surreal de Sóstenes Cavalcante é o mesmo que desacreditar da tese sociológica de que político é uma pessoa que invoca a Deus para ganhar votos e recorre ao Satanás para ganhar propina. Se os iludidos insistem em achar que há políticos perfeitos, é chegada a hora de nós, que não somos iludidos com a política, nos rendermos à convicção de que perfeitos são os iludidos. Não sou daqueles que desenvolve idolatria sem saber. Além do mais, não acho que somente a igreja X ou Y me levará até Jesus.

Eis a razão pela qual abomino os políticos que costumam associar a lavagem cerebral de determinadas religiões à lavagem do dinheiro público. Também é essa a razão da diferença entre estadista e político. O primeiro é alguém que pertence à nação. O segundo, alguém que pensa que a nação lhe pertence. Do meu simbolismo de inteligência, construído sobre a estultice alheia, permaneço convencido da máxima de que “um povo que aceita passivamente a corrupção e os corruptos não merece a liberdade. Merece a escravidão”. Considerando que, em política partidária, os aliados de hoje são os inimigos de amanhã, minha primeira opção será sempre a zona. A segunda e terceira, as moças da zona. Elas são mais confiáveis. Resumindo a ópera, é melhor confiar nas moças de vida fácil do que nos políticos de fácil vida.

*Wenceslau Araújo é Editor-Chefe de Notibras

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