Quem brinca com fogo acaba se queimando, quem sonha com água pode acordar mijado e aqui se faz aqui se paga. São todos ditados populares e autoexplicativos, principalmente se tomarmos como público alvo os que fazem o mal em série e sem qualquer preocupação quanto aos atingidos. Ainda mais enfática é a tese de quem planta vento colhe tempestade. Pois bem, a casa caiu para um punhado de patriotas de araque, aqueles que nos últimos quatro anos usaram da retórica ditatorial e da política de veneração pessoal para fazer da nação um gueto explorável conforme suas conveniências. Lembro de uma recente frase da natimorta bolsonarista raiz Sara Winter. Segundo ela, quem ”não venerar o Jair significa sofrer um assassinato de reputação”.
Veneraram demais e se deram mal. Pior do que a reputação, em breve passarão a ver o sol quadrado. A ação determinada na quinta-feira (15) pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes não foi bem uma surpresa. Talvez os coiotes de Jair Messias não esperassem para agora. Entendo que poucos acreditavam que a astúcia de Moraes fosse mais célere do que os planos B, C e D da turma do ódio comandada silenciosamente pelo mito de barro. O fato é que, rápidas como um raio, começaram a chegar as penitências para os horrores cometidos pelos falsos profetas do Brasil do futuro. Meu lado cristão, impede que torça para que ardam no fogo do inferno, mas não há dúvida de que pagarão caro pelas desinformações criminosas, pelas intimidações sacanas e, sobretudo, pelas tentativas de reincorporar ao cenário nacional a tragédia da ditadura.
O fracasso do governo do Jair desencadeou um rápido processo de pulverização dos fanáticos de ultra direita. É claro que eles continuarão existindo. Devem existir, pois permanecerão fazendo parte do processo político. No entanto, duvido que mantenham a mesma força concentrada em um líder que nunca liderou. Apenas jogava o jogo. Também avesso ao extremo oposto, assumo minha aposta sobre a possibilidade de, em breve, os bolsonaristas raiz parecerem uma espécie em extinção. Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Moraes é hoje o Homem de Ferro do Judiciário e o Sansão dos trópicos. Seu poder obviamente que não está na armadura (a toga), tampouco nos cabelos, mas na coragem, na caneta e na vontade de transformar o Brasil em um país sério, cordato, respeitado interna e externamente. E feliz.
Nunca vi, mas tenho quase certeza de que sua caneta não é uma BIC. Talvez de posse de uma Montblanc ou de algo menos demagogo, Alexandre picotou a mangueira que mantinha o oxigênio dos golpistas nas estradas, em frente aos quartéis ou nos centros das grandes capitais. Acabou a brincadeira. Agora é sério. Como foi um dia João Paulo II, Xandão é pop, é macho e, ao que parece, não tem medo de cara feia ou de coturnos. Sua intenção é assorear os cofres dos financiadores dos golpistas, de modo a desentocar as vaquinhas de presépio, os paus-mandados. A exemplo de todo o Brasil, Alexandre de Moraes sabe que os “patriotas” estão acoitados em áreas militares, de onde podem entrar e sair em segurança. Em Brasília, a pedido do presidente da República, o comando do Exército, abriu uma área para estacionamento de automóveis, caminhões e tratores.
É uma inversão absoluta de valores, algo como uma conspiração em estado de latência, esperando o acúmulo de forças ou a continuidade desses atos até o dia da posse. Em outras palavras, os bolsonaristas nariz ou de folha seca teimam em não voltar ao ostracismo de onde saíram. Nessa quinta-feira, foram prisões e buscas contra cerca de 100 acusados de participação e/ou financiamento de atos antidemocráticos. Muitos outros virão, pois, conforme afirmação de Xandão, é impossível o ódio vencer o amor. Eleito democraticamente pelo povo, o presidente é Luiz Inácio Lula da Silva. O vice é Geraldo Alckmin, ambos civis, democratas e conscientes das responsabilidades com o povo brasileiro. Com eles, temos tudo para dar vários passos à frente. O tempo é de recuperar o período do modo caranguejo.
A operação determinada pelo STF é o início da desarticulação do caranguejal. Aliás, apenas para ilustrar, um caminhão de mudanças encostado tarde passada no Palácio da Alvorada tinha uma marca pra lá de sugestiva: Muda Brasília. Pois é, o presidente “embalando copos” e a patriotada sob sol e chuva, esperando pelo que não virá. Tem povo para tudo. É o Brasil de volta para o futuro, agora ancorado pela alquimia entre o povão e as forças democráticas. Democrata convicto, faço minhas as palavras do filósofo Leandro Karnal: “A democracia não é o paraíso, mas ela consegue garantir que a gente não chegue ao inferno”. Fã ilimitado dos memes, não poderia concluir esta narrativa sem a última das publicações sobre o ministro Alexandre de Moraes: “Moet Xandão, o Brut de verdade”. Pronto, para quem ainda estava em dúvida, eis uma sugestão de bebida para o réveillon na Praça dos Três Poderes.
*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978